sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Everton e Wolfsburg prometeram um duelo interessante pela Europa League e cumpriram

Na rodada de abertura da Europa League, a partida que mais chamava atenção, em um primeiro momento, aconteceria na Inglaterra. Pelo grupo H, o Everton recebeu o Wolfsburg, no Goodison Park. Além dos ingleses e dos alemães, o grupo da morte também conta com Lille e Krasnodar, que eliminou a Real Sociedad nos play-offs.

Roberto Martínez fez bom trabalho no Wigan e chegou ao Everton no início de 2013-14 para o lugar do ídolo da torcida, David Moyes, que aceitara o duro desafio de substituir Alex Ferguson no Manchester United. Martínez fez campanha magnífica em sua primeira temporada no Goodison Park e levou o time azul de Liverpool à quinta colocação da Premier League, quase conseguindo uma classificação histórica para a Champions League. O Everton de Martínez é um time com DNA ofensivo, que joga em um 4-2-3-1 extremamente dinâmico, com forte movimentação no último terço do campo.

Contra o Wolfsburg, McGeady foi o winger pela direita, enquanto Mirallas executou a mesma função no lado oposto. Os dois jogadores trabalham bem pelos extremos do campo, mas também tendem a centralizar para abrir o corredor para os alas, que chegam com muita qualidade na linha de fundo e na infiltração em diagonal. Foi assim que Baines deu as duas assistências para os dois primeiros gols, sendo uma delas para o lateral-direito Coleman, em uma situação incomum no futebol, quando dois laterais chegam na pequena área ao mesmo tempo. Lukaku era o centroavante e Naismith ocupava o centro da linha de três que ficava atrás do belga. Como o escocês é originalmente atacante, sua noção de posicionamento permite ao Everton um revezamento na referência, hora com Lukaku, hora com Naismith, o que atrapalha a marcação e quebra as linhas defensivas rivais com facilidade. Dentro da área, Naismith abriu o marcador após ótima triangulação, que também teve participação de Baines e McCarthy, o volante de maior chegada. Em fase defensiva, ele e Gareth Barry marcam com a mesma intensidade no meio-campo, mas, na hora de atacar, a ótima dupla tem suas funções definidas: Barry organiza o jogo a partir do meio e McCarthy chega mais perto da área para dar superioridade numérica aos Toffees. Outra situação interessante na ocasião do primeiro gol foi provocada por Mirallas, que nem participou ativamente da jogada, mas se movimentou em direção à linha lateral, arrastando seu marcador e o afastando do resto da linha defensiva, abrindo um espaço imenso entre o lateral-direito e o zagueiro para ser atacado por Baines, proporcionando ao jogador da seleção inglesa a oportunidade de receber livre para dar a assistência a Naismith. O espaço vazio não pôde ser preenchido por Luiz Gustavo justamente porque o brasileiro estava preocupado com a chegada do volante McCarthy (aí a superioridade numérica que provoca espaços). O lance ilustra bem o futebol moderno: volantes chegando no ataque, jogo de transição rápida, trocas de passe em progressão e movimentação sem a bola para abrir espaço.

Sem a bola, Mirallas se movimentava durante a partida para dar corredor para Leighton Baines, seja pela ponta, ou por dentro, como o caso deste flagrante, minuciosamente explicado no parágrafo acima (Reprodução: Esporte Interativo)

O Wolfsburg também fez um bom jogo. Dieter Hecking armou um 4-2-3-1 leve e ofensivo, que tinha, na linha de três meias, Caligiuri pela ponta direita, Arnold como o meia central e De Bruyne pelo lado esquerdo. O jovem belga tinha bastante liberdade para circular fora do seu setor com a bola no pé, o que abria o corredor para os avanços do ótimo lateral Ricardo Rodríguez, que fez grande Copa do Mundo pela Suíça. Sua manutenção no elenco dos lobos talvez seja a maior conquista do Wolfsburg no mercado de transferências. Defensivamente, os alemães fechavam-se em duas linhas de quatro compactas, mas tinham dificuldades em compreender a movimentação de ataque adversária.


Everton e Wolfsburg montados no 4-2-3-1

Comparação entre os mapas de movimentação de Luiz Gustavo no Wolfsburg contra o Everton (à esquerda) e no Brasil contra a Colômbia (à direita). Volante brasileiro contribui muito mais nas jogadas de ataque do seu time do que na seleção, onde se limita a ajudar na saída de três entre os zagueiros e a guardar posição para dar liberdade aos homens de frente e aos laterais. Como Luiz Gustavo fez carreira na Alemanha, a forma como é utilizado na Seleção dá ao torcedor brasileiro que não acompanha de perto o futebol europeu uma impressão equivocada sobre o tipo de jogador que ele é (Reprodução: Imagem 1/Squawka e Imagem 2/Footstats)

Na segunda etapa, Hecking já veio com Aaron Hunt no lugar de Malanda, recuando Arnold para atuar ao lado de Luiz Gustavo na primeira linha de meio-campo. Esta formação com mais jogadores de características ofensivas levou o Wolfsburg ao ataque, especialmente após sofrer o terceiro gol logo nos primeiros minutos da segunda parte, em falta sofrida por McGeady na entrada da área, mas que a arbitragem liderada pelo italiano Luca Banti viu dentro e apontou erradamente pênalti, convertido pelo nome do jogo, Leighton Baines. Com o placar amplamente desfavorável, o Wolfsburg foi pra frente e comandou o segundo tempo, já o Everton compreensivelmente sentou no resultado e preferiu se resguardar. Naismith passou a atuar ao lado dos volantes em fase defensiva e com responsabilidade de puxar o contragolpe pelo meio quando da retomada da posse da bola. Com constante movimentação e criação concentrada nos pés de Hunt e De Bruyne, o Wolfsburg finalizou o jogo com números ofensivos superiores ao rival inglês. Os alemães tiveram 53 ataques perigosos, criando deles 23 chances de gol, contra 12 dos Toffees, que tiveram 41 ataques. Tim Howard foi um dos destaques do Everton, com dez defesas no decorrer do jogo.

Everton compactou-se com uma linha de cinco homens à frente da defesa para tentar suportar a pressão. Apesar do sofrimento, os ingleses conseguiram sucesso na empreitada

A pressão do Wolfsburg só foi amenizada após a entrada de Samuel Eto’o no lugar de Lukaku, que ainda não conseguiu atuação de grande destaque desde que foi adquirido em definitivo pelo Everton. Eto’o entrou muito bem e, com sua experiência e qualidade, deu a tranquilidade que seu time necessitava para matar o jogo de vez e esfriar a pressão rival. O camaronês voltava mais para buscar o jogo do que Lukaku, participando da criação e fazendo com que os pontas McGeady e Mirallas deixassem de ser os meros defensores em que haviam se transformado após o terceiro gol. Foi de Eto’o o passe para o tento de Mirallas, que decretou a vitória e fez com que os lobos praticamente desistissem de atacar. Nem os cruzamentos na área, que tinham se tornado constantes após a entrada do possante Bendtner, passaram a assustar mais a torcida presente no Goodison Park. O Wolfsburg fez o gol de honra apenas nos acréscimos, em linda cobrança de falta de Rodríguez.

Entrada de Gibson deu mais consistência ao meio-campo do Everton e Eto’o tranquilizou o time para resolver o jogo com a bola no pé. Desesperado, Wolfsburg abusou da jogada aérea a partir da segunda metade do segundo tempo

No grupo mais encardido da Europa League, o Everton fez o dever de casa e dá passo importante para a classificação, ao vencer o adversário teoricamente mais difícil. O Wolfsburg também é favorito para passar de fase, sobretudo após o empate no outro jogo da chave e também pelo que mostrou na visita a Liverpool, apesar da derrota elástica. O Everton de Roberto Martínez, ainda mais experiente e com um elenco mais recheado do que na temporada passada, chega como postulante ao título, principalmente se levar a competição a sério como a escalação e a atuação na primeira partida deram a entender.

*Dados estatísticos retirados do UEFA.com.

Por João Marcos Soares (@JoaoMarcos__)