quinta-feira, 25 de setembro de 2014

No Orlando Scarpelli, Figueirense varia novamente e confirma os seis pontos contra o Corinthians no BR14

Em situações opostas na tabela e no momento do campeonato, Figueirense e Corinthians se enfrentaram pelo Brasileirão. O time catarinense é, talvez, o adversário mais indigesto do Timão na temporada, já que havia vencido a partida do primeiro turno, que marcou a estreia na Arena, o tão sonhado estádio próprio corintiano. No Orlando Scarpelli, o Figueira, há quatro jogos sem vencer, buscava se recuperar no campeonato e justificar a fama de estraga-prazeres, freando a empolgação dos paulistas, que chegaram para o duelo de alvinegros com moral trás vitória contundente no dérbi contra o São Paulo.

Argel Fucks voltou a variar taticamente o Figueirense, que, em suas mãos, vinha tendo o 4-3-1-2 com losango no meio e o 4-2-3-1 como esquemas mais utilizados. Contra o time de Mano Menezes, Argel escalou um meio-campo rigorosamente igual ao que enfrentou o Criciúma, duas rodadas atrás. No entanto, a repetição ficou só nos nomes e o Figueirense foi a campo no 4-4-2, em detrimento do 4-3-1-2 do clássico catarinense. Marco Antônio, que tem atuado fundamentalmente como volante de saída em Santa Catarina, foi deslocado para o lado direito do meio-campo para executar o trabalho de winger. No extremo oposto, a função foi desempenhada por Giovanni Augusto, que geralmente é o enganche do Furacão do Estreito. Giovanni tem feito bom campeonato e busca se consolidar no futebol brasileiro e não ser lembrado apenas como o autor do primeiro gol da Arena Corinthians. No Scarpelli, mesmo sem marcar gols, o meia continuou a dar trabalho para o Timão, sendo o principal destaque ofensivo do morno primeiro tempo.

Discutimos há algumas rodadas no podcast da Prancheta Tática a questão do 4-4-2 britânico estar sendo bastante utilizado no Brasil, abrindo pontas ou até camisas 10 de origem para agredir/armar a partir dos flancos e empregando um ponta-de-lança atrás do atacante de referência, como os casos de Ricardo Goulart no Cruzeiro, Diogo ou Leandro no Palmeiras, Diego Souza no Sport e Alan Kardec no São Paulo, ou mesmo a utilização de dois atacantes atuando lado a lado e revezando a referência, com movimentação constante para um abrir espaço ao outro, como Eduardo e Alecsandro no Flamengo e, por vezes, Marcelo e Delatorre ou Douglas Coutinho no Atlético-PR. O Figueira é mais um a aderir à tendência, pelo menos na partida contra o Corinthians.

Mano Menezes, por sua vez, repetiu a formação tática do Majestoso, apenas com a troca de Fábio Santos, suspenso, por Uendel e a volta de Elias no lugar de Bruno Henrique. O 4-2-3-1 corintiano tinha Malcom dando agressividade pela esquerda, Danilo tentando armar por dentro e Renato Augusto trabalhando pelo lado direito e buscando a centralização, abrindo, assim, o corredor para a ultrapassagem de Fágner.

Alvinegros fechavam duas linhas de quatro bastante compactas na fase defensiva, mas sistemas táticos eram diferentes

O primeiro tempo foi de poucas chances de gol, mas o Figueirense teve um leve domínio das ações, já que compactava bem suas linhas na hora da marcação e tinha uma transição ofensiva muito veloz, com o recuo de Marco Antônio para buscar a bola na intermediária e a agressividade de Giovanni Augusto pela esquerda e Pablo pela direita, que contava com o apoio do lateral Leandro Silva, de boa primeira etapa. Em fase de marcação, o Figueirense deixava seus dois atacantes para dar o primeiro combate e atrapalhar a saída de bola do Corinthians, enquanto os meio-campistas fechavam uma linha de quatro que não deixava Danilo e Renato Augusto armarem por dentro, mesmo com o esforço intenso de Guerrero e Malcom para tentar dar profundidade pelo centro e pela esquerda, respectivamente. Elias, recuperado de amigdalite, chegava pouco para auxiliar na armação e menos ainda para tentar infiltrar, já que a compactação catarinense não permitia a Guerrero se movimentar e abrir espaços para serem atacados pelos homens surpresa.

Dez homens de linha do Figueirense participam da fase defensiva, que praticamente não deu margem a críticas contra o Corinthians (Foto: João Marcos Soares/A Prancheta Tática)

Outro aspecto interessante da marcação catarinense é pouco usual no futebol atualmente. Argel Fucks conseguiu combinar com maestria a modernidade da compactação e da transição veloz com a boa e velha marcação individual. Embora não fosse uma perseguição no campo inteiro digna de times de Joel Santana, França executava encaixe em Danilo, meia central do 4-2-3-1 corintiano. Danilo atua justamente no entrelinhas, onde não há jogador adversário para limitar seu espaço. Neste sentido, Argel viu no desacreditado França uma alternativa para vigiar o meia em praticamente todas as jogadas de ataque do Corinthians, não dando espaço, por exemplo, para que Danilo encontrasse um passe como o que deixou Paolo Guerrero na cara de Dênis para marcar o gol da vitória contra o São Paulo, no último domingo. França, que chegou ao Figueirense em maio, fez apenas sua quarta partida pelo clube, já que teve problemas de lesão e comportamento. O volante que pertence ao Palmeiras teve atuação essencial e bastante elogiada pelo seu comandante na entrevista coletiva pós-jogo, quando Argel, inclusive, reconheceu que o camisa 16 deu atenção especial a Danilo.

França dá atenção especial a Danilo, enquanto os outros integrantes do meio-campo se aproximam e voltam para compactar de acordo com a progressão adversária (Foto: João Marcos Soares/A Prancheta Tática)

O Corinthians também fechava duas linhas de quatro bastante próximas na marcação, que era bem executada e dificultava muito a criação adversária. Renato Augusto recompunha pela direita e Malcom pela esquerda, enquanto Guerrero dava o primeiro combate e Danilo marcava a saída dos volantes. O 4-2-3-1 tradicional de Mano Menezes sentia muita dificuldades na armação, já que Danilo estava anulado por França e Renato Augusto encontrava problemas para centralizar e auxiliar o camisa 20, talvez por alguma limitação física que ainda não permita ao camisa 8 voltar pelo flanco direito para marcar e depois centralizar para armar na mesma intensidade, ou simplesmente porque Mano não percebeu a atenção especial de França a Danilo, o que é pouco provável pelo que se conhece da capacidade de leitura de jogo do técnico corintiano e pelo fato de o movimento defensivo catarinense estar cristalino desde os primeiros minutos.

4-2-3-1 corintiano era forte na marcação, mas pouco ativo no ataque (Foto: João Marcos Soares/A Prancheta Tática)

A segunda parte iniciou com os mesmos times e o mesmo panorama da primeira: equilíbrio nas ações e disputa territorial no meio-campo. Sem ver melhoras no jogo de seu time, Mano desistiu de Danilo e pôs Jádson, que passou a ocupar a faixa esquerda do meio-campo, enquanto Malcom abriu pela direita e Renato Augusto passou a ser o armador central. Poucos minutos depois, Lodeiro entrou no lugar de Elias para atuar na mesma faixa do campo, mas com o objetivo de chegar mais à frente e se juntar a Renato Augusto e Jádson na armação. Malcom, que ficou preso no flanco esquerdo sem sucesso no primeiro tempo, passou a ter mais espaço pelo extremo oposto, promovendo duelos constantes com o lateral-esquerdo Marquinhos Pedroso, que teve ótima atuação trás reestreia não tão boa contra o Santos. Mesmo com um meio-campo bastante técnico, o Corinthians pouco criava e ainda tinha menos posse de bola que o Figueirense.

Na tentativa de buscar o resultado em casa, Argel Fucks trocou suas duas peças de ataque, promovendo as entradas de Clayton e Marcão nas vagas de Pablo e Everaldo. Clayton entrou na mesma posição de Pablo, mas impondo características diferentes. Enquanto o camisa 11 trabalha melhor sem a bola ao atacar espaços vazios, Clayton é um atacante que prefere ela no pé para partir pra cima dos defensores adversários em velocidade, o que é era uma ótima alternativa considerando o fato de que o Corinthians estava mais aberto no segundo tempo, evidenciando que as substituições de Argel eram claras respostas às de Mano. Marcão é um centroavante que se movimenta menos que Everaldo, mas tem experiência e inteligência destacadas para se posicionar na área e prender a bola enquanto aguarda a chegada dos meio-campistas e laterais. Clayton e Marcão formaram a dupla de ataque do Figueira em grande parte da sequência de oito partidas invictas, mas uma lesão do centroavante e a queda de rendimento do garoto da base fizeram com que ambos perdessem vaga no time titular.

Times mantêm esquemas, mas mudam características das peças para a segunda etapa

Na parte final da partida, os jogadores corintianos se desesperaram um pouco com o 0x0 e tentavam o ataque sem muita organização, enquanto o Figueirense permanecia tranquilo na sua proposta de igualar o jogo no meio-campo e, quando da recuperação da bola, acelerar o contragolpe com Clayton e Giovanni Augusto, e foi assim que o time iniciou o lance que culminou no gol da vitória. Guerrero recebeu lindo passe de Luciano e acertou a trave de Tiago Volpi, na única clara chance corintiana na partida. No contra-ataque, o Figueira conseguiu um primeiro escanteio, interceptado em direção à linha de fundo pela defesa. Na segunda cobrança, a sempre importante bola parada de Marco Antônio encontrou Marcão para cabecear aproveitando saída desastrosa de Cássio e anotar seu primeiro gol com a camisa alvinegra.

Com a vitória, o Figueirense aumenta a distância para a zona do rebaixamento e se mantém como o melhor catarinense na Série A, enquanto o Corinthians sai do G-4 e vê a distância para o Cruzeiro aumentar para doze pontos. O Figueira conseguiu seis pontos contra o Corinthians no Brasileirão com méritos diferentes nas duas partidas. Se encaixou uma retranca sólida e eficiente armada por Guto Ferreira em Itaquera, jogou de igual pra igual e dominou as ações no Orlando Scarpelli e mostrou que está encaixado com  Argel Fucks e suas variações, batendo um Corinthians que mantém a mesma estrutura tática desde o início do campeonato, parecendo não considerar que os adversários nunca são iguais.

Por João Marcos Soares (@JoaoMarcos__)