Pelo grupo da morte da Champions League, a Roma
recebeu o Bayern de Munique em confronto válido pela terceira rodada. Sabendo
do empate entre CSKA Moscou e Manchester City na Rússia, a Roma buscava somar
pelo menos um ponto para manter a distância para o City, terceiro colocado, e
não deixar o Bayern disparar na liderança.
Apesar de uma eventual igualdade no placar não ser
de todo ruim para o time italiano, Rudi García mandou a campo uma escalação
ofensiva, sem estratégia especial para tentar anular o time que joga o futebol
mais vistoso da Europa. Confiando no seu sistema de jogo e com a maioria dos
titulares à disposição, García escalou a Roma no 4-1-4-1, que tinha Gervinho e
Iturbe abertos e Totti como falso 9, na real acepção do termo.
Quando conseguia, Roma se compactava no seu 4-1-4-1 tradicional
desde a chegada de Rudi García (Reprodução Sports +)
Pep Guardiola foi ao Stadio Olimpico com um time
muito parecido com o que venceu o CSKA na rodada anterior, apenas com a entrada
de Boateng na vaga de Dante. Apesar de repetir quase todos os jogadores, a
formação foi um pouco diferente, podendo ser traduzida para um 3-4-3, embora a
movimentação fosse extrema. Em Moscou, Lahm atuou como lateral e, em Roma, o
capitão bávaro se posicionou majoritariamente como volante. Apesar de esta ser
a única mudança mais perceptível de posicionamento, ela influenciava
principalmente na fase defensiva, já que Lahm não fechava pela direita a linha
de cinco com os zagueiros, papel que era executado por Arjen Robben, que, contra
o CSKA, compunha a segunda linha de quatro. No Olimpico, Müller e Götze
recompunham pelos lados para montar o 5-4-1 que tem sido a tônica da fase
defensiva do Bayern na temporada, apesar de ser pouco necessário, já que o time
sempre tem a bola e, portanto, dificilmente precisa se defender, além de
executar marcação pressão prioritariamente, fazendo com que a marcação em bloco
no 5-4-1 fique apenas para situações em que o adversário consegue ultrapassar a
pressão alta bávara.
Roma no 4-1-4-1 e Bayern no 3-4-3 mais dinâmico da
atualidade
Diferente da partida de Moscou, o Bayern encontrou
um time mais aberto pela frente. Rudi García não se preocupou tanto em
enfrentar o temido Bayern de Munique e, acostumado a ter a bola nos jogos do
campeonato italiano, não conseguiu conter um time que mantinha o controle durante
a maior parte do jogo.
O Bayern iniciou a partida avassalador e o
carrossel bávaro abriu o placar antes dos 10 minutos com jogada individual de
Robben pela direita. Após o gol, os alemães continuaram atacando e foram
conseguindo furar a defesa giallorossa sem
grandes dificuldades. Após jogada bem trabalhada em passes curtos, Götze
aumentou a vantagem.
Com Xabi Alonso no meio-campo, Guardiola conseguiu o
jogador que tinha buscado em Phillip Lahm na última temporada para organizar o
time no meio-campo e tomar as decisões enquanto troca passes com a ajuda de
Lahm e Alaba e observa a movimentação dos homens de frente, que são agudos e
conseguem dar a verticalidade que o técnico sempre procurou para equilibrar seu
jogo de posse de bola, de modo que não ficasse chato e inoperante.
O terceiro gol ilustra bastante do estilo de ataque
do Bayern. Lahm e Alonso ficam na intermediária valorizando a bola, enquanto
Robben e Bernat dão amplitude pelos lados e Müller, Götze e Lewandowski se
movimentam para bagunçar a última linha da Roma. Com três jogadores entre os
defensores romanistas, os laterais
precisam se aproximar dos zagueiros para encurtar os espaços, deixando os lados
um pouco mais abertos para Robben e Bernat e aumentando as responsabilidades
dos wingers na recomposição. No gol,
Xabi Alonso aguarda o momento certo e lança Bernat na esquerda, o lateral chega
à linha de fundo e cruza para Lewandowski marcar de cabeça.
Terceiro gol: Alonso toma a decisão com base nas
opções que os 5 “atacantes” proporcionam (Reprodução: Sports +)
Outro movimento interessante e comum do Bayern
também pode ser ilustrado em um dos gols contra a Roma. Na partida de Moscou,
contra o CSKA, o gol da vitória saiu de um pênalti originado por uma jogada de
Lewandowski. O centroavante saiu da última linha de defesa do rival e puxou um
dos zagueiros, Ignashevich, já que a marcação russa tinha encaixes individuais,
pois atuava com cinco homens na última linha. Tal movimento do defensor do CSKA
quebrou a última linha de defesa do time e deu espaço para Götze atacar e,
quando receber a bola, sofrer o pênalti do lateral Mario Fernandes, que
precisou fazer a cobertura por dentro. Na Itália, os três atacantes também
executavam movimentos parecidos e o quarto gol bávaro surgiu de um destes
deslocamentos. Lewandowski saiu da área para dar superioridade na intermediária
e, mesmo sem arrastar defensores, já que a Roma atuava com quatro homens na
última linha, conseguiu chamar a atenção dos três volantes giallorossi e, como os wingers
não chegaram para a recomposição (Iturbe
é visto afastado e Gervinho nem aparece na imagem), os volantes dando
atenção apenas a Lewandowski deixaram os laterais expostos e o polonês
encontrou passe em profundidade para Robben entrar pelas costas de Ashley Cole
e marcar o quarto gol alemão. Caso o 4-1-4-1 da Roma estivesse formado, a
situação não aconteceria, mas como os times que jogam neste sistema por vezes
não poderão contar com os atacantes de lado na recomposição, já que eles
precisam atacar também e nem sempre conseguem voltar rapidamente, é necessário que os volantes balancem corretamente para
proteger a última linha defensiva.
De Rossi, Naiggolan e Pjanic se preocuparam apenas com
o ser estranho no setor (Lewandowski) e esqueceram de sua principal função:
proteger a linha defensiva (Reprodução: Sports +)
Para encerrar as análises dos movimentos ofensivos
do Bayern, o quinto gol apresenta mais um fator interessante que atrapalha as
marcações: o fator-Alaba. O lateral é o mais difícil de se apontar uma posição
ou função dentro de campo. Alaba atua como terceiro zagueiro na fase defensiva,
volante no momento das trocas de passe no meio-campo e também aparece como
lateral para fazer a dobradinha com Bernat pela esquerda e chegar à linha de
fundo, como aconteceu no quinto gol do Bayern, o último do primeiro tempo,
quando o austríaco aparece pela esquerda para trabalhar com o ala espanhol e dá
superioridade numérica ao Bayern no setor, atrapalhando a já atrapalhada
marcação da Roma.
Alaba aparece como lateral pela esquerda e consegue
criar um pênalti após tentar cruzamento cortado pelo braço de Manolas
(Reprodução: Sports +)
Com uma primeira etapa avassaladora, o Bayern tirou
o pé no início do segundo tempo e a Roma buscou diminuir o vexame com as
mudanças feitas por García no intervalo. O treinador francês trocou Ashley
Cole, que tomou baile de Robben no primeiro tempo, pelo grego José Holebas. No
ataque, il capitano Totti cedeu
espaço para Florenzi. As modificações também indicaram um novo posicionamento à
Roma, que passou a atuar em um 4-2-3-1, que tinha Florenzi e Iturbe fechando os
extremos, De Rossi e Nainggolan como dupla de volantes e Pjanic na faixa
central da linha de três meias, enquanto Gervinho era o homem mais avançado.
Neste sentido, a Roma acelerou a transição ofensiva e ganhou em contra-ataques,
conseguindo, inclusive, marcar o gol de honra após jogada pela esquerda,
finalizada por Gervinho de cabeça. Além do gol, a Roma também criou outras
oportunidades, defendidas por Neuer ou pela trave.
O Bayern com muito menos ímpeto, continuava a ter
mais a bola, mas tinha um pouco mais de dificuldades para atravessar as duas
linhas de quatro da Roma, agora, sim, realmente compactas. Depois de algum
equilíbrio nas ações da primeira metade da segunda parte, o Bayern voltou a ter
o domínio do jogo após as entradas de Ribéry e Shaqiri, que, ao contrário dos
companheiros que participaram do primeiro tempo, não estavam cansados de fazer
gol e precisavam mostrar serviço porque a concorrência no Bayern de Munique é
das maiores do mundo. Neste sentido, contra uma Roma que já não se preocupava
tanto em se defender, os dois recém-promovidos conseguiram marcar um gol cada e
fechar o placar em um 7 a 1 familiar aos brasileiros. Neuer, Boateng,
Lahm, Müller e Götze estiveram nos dois 7 a 1 mais famosos dos últimos tempos
no futebol mundial. E sempre do lado vencedor.
Roma busca a velocidade no 4-2-3-1 e Bayern ganha
ainda mais o meio-campo com o adiantamento de Alaba para completar um 4-1-4-1
O vexame histórico não apaga o excepcional trabalho
que Rudi García tem feito no calcio,
onde recuperou uma Roma totalmente coadjuvante nas últimas temporadas do também
coadjuvante futebol italiano. Os giallorossi
brigaram pelo título nacional com a Juventus de Antonio Conte e voltaram à
Champions League sob a batuta do treinador francês, que trouxe uma nova forma
de ver futebol para a velha Bota, tão atrasada taticamente com relação aos outros
centros futebolísticos da Europa. O 7 a 1 da Cidade Eterna precisa ser muito
criticado e servir de exemplo para a Roma, mas não deve colocar em xeque o
cargo de García, um dos técnicos mais promissores do futebol europeu, que teve
um dia terrível que certamente o trará bastante experiência. A autocrítica que
o treinador demonstrou na coletiva pós-jogo demonstra isso.
Há que se valorizar principalmente o que fez o
Bayern de Munique no Olimpico. Os bávaros têm mostrado uma nova forma de jogar
futebol, que certamente fará história e servirá como objeto de estudo para
muitos, já que Guardiola parece estar conseguindo combinar o estilo de posse de
bola de sua passagem pelo Barcelona, com uma movimentação avassaladora e uma
sede de gols implacável, encantando, pois, até os que ainda têm a imagem do
futebol mais lento e menos direto de quando Pep comandava o Barcelona.
Por João Marcos Soares (@JoaoMarcos__)