sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

ESPECIAL HOLANDA 1974: A ARTE DE UM CARROSSEL - PARTE 3: O PRÉ-COPA DAS PRINCIPAIS PEÇAS DO CARROSSEL

Nessa parte do especial, falarei sobre como foram os anos que antecederam a copa de 1974 das principais peças que compuseram o carrossel. Desfrutem:

PARTE 3: O PRÉ-COPA DAS PRINCIPAIS PEÇAS DO CARROSSEL

Os anos que antecederam a copa de 1974 foram de muitas conquistas para o futebol Holandes. Na Liga dos Campeões, últimos quatro anos de domínio dos neerlandeses, com um título do Feyenoord em 1970 e tres títulos do Ajax no trienio 71-72-73. Domínio absoluto por parte dos times, porém a seleção ainda cambaleava e muito.

FEYENOORD 

Primeiro campeão europeu holandês da historia


O já campeão holandês da temporada de 1968-1969 vinha para uma Liga dos Campeões motivado para ganha-la após, no ano anterior, o rival Ajax ter perdido a final para o Milan. No comando do time, uma troca para lá de ousada: o então treinador Ben Peeters foi rebaixado de novo para as categorias de base e trouxeram o Austríaco Ernst Happel. Brilhante técnico que encontrou um elenco sólido, coeso, equilibrado, de muito potencial e de reforços como o lateral esquerdo Van Duivenbode, dispensado do Ajax.

Na Liga dos Campeões, evoluíram jogando um futebol ofensivo e muito objetivo. Após a perda do campeonato holandês para o rival, se concentraram no torneio continental e foram pra cima dos adversários. Happel fixou um 4-3-3, novidade para uma época onde se predominava o 4-2-4. Ao perceber que o domínio do meio campo influenciava e muito na partida, o treinador recuou um jogador do ataque e ganhou muito mais controle da pelota. O time ficava mais ou menos assim:


O time acima foi o que jogou a final contra o Celtic. O goleiro titular era Treytel, constantemente convocado para a seleção, que não participou da partida para o lugar de Graafland, goleiro de muita presença física e de qualidade no 1vs1. Happel apostou em laterais mais marcadores como Romeijn e Van Duivenbode, mas que quando subiam eram eficientes. No miolo de zaga (Israel e Laseroms), uma dupla que, apesar de as vezes ser ríspida demais defendendo, sabia manejar a pelota e dava qualidade a saída, sabendo se usar tanto da bola curta no tripe de meio campo, como na bola longa nos pontas. 

No setor de meio de campo, dois dos três que viriam a compor o centro do Carrossel holandês. O primeiro deles era Jansen, motorzinho do time, o jogador mais versátil. Veloz e baixinho, tinha uma visão de jogo diferenciada e sabia atacar muito bem o espaço que os atacantes liberavam. O segundo era Van Hanegen,  meia canhoto de muita cadencia, ritmo lento e que gostava de explorar o lado esquerdo apoiando quem viesse por aquele corredor. O terceiro era o Austriaco Hasil, que tinha muita qualidade no passe, deixando o trio em ótimas condiçoes muitas vezes.

Ja no ataque, dois pontas velozes e importantes para o tambem esquema de circulação veloz de Happel. Wery pela direita foi importantíssimo fazendo gols chaves, como o da final e Mouljin essencial para desmontar as defesas adversárias com seus dribles desconcertantes. Para muitos, esse ultimo é o maior atacante da historia do clube. No centro, o sueco Kindvall se destacava por sempre se posicionar muito bem e fazer muito gol.

"Kindvall e o capitão Israel com a taça."


Ernst Happel, após ganhar mais um holandes em 1971-1972, viria sair dois anos depois para a entrada de Wiel Coerver, técnico estudioso e que possuia métodos próprios e diferentes de treinamento, de muito enfase no técnico-tático de forma progressiva, desde treinos simplíssimos a outros muito complexos. Seu método encantou o grupo e fez o clube retomar o caminho das vitórias.

Com um ataque massivo de 96 gols em 34 jogos, voltaram a ganhar o campeonato nacional após perderem para o Ajax no ano anterior. Com um time ainda veloz, mas mais flexível taticamente e com muito mais jogadas treinadas. Paralelamente ao torneio, disputavam a Copa da UEFA, essa que venceram com imponência, após uma dura batalha contra os ingleses do Tottenham. Com o mesmo 4-3-3, entraram em campo assim:



Mais flexível  o Feyenoord de Coerver apostava em laterais de muita explosao física e que se superavam facilmente na marcação. Ambos, Rijsbergen e Vos, viriam a ser convocados por Michels. Ao lado do xerife Israel, o técnico consolidou o então zagueiro reserva Van Daele, que gostava muito de sair para fazer número no meio campo.

Na meiúca, os mesmos Jansen e Van Hanegen, com mais liberdade, se mantiveram, mas ao inves de Hasil, um outro futuro convocado viria a compor o setor. Theo de Jong tinha boa noção de ataque vertical e incorporava a linha de frente com muita facilidade, além de cobrir as subidas de Jansen quando ele resolvia ir mais a frente. Um pouco de "Futebol Total" do rival no Feyenoord.


Com o envelhecimento dos atacantes campeões continentais, o técnico apostou num trio novo. Hassel pela direita lembrava muito Mouljin com seus dribles e Kristensen, mais versatil, buscava muito a bola no meio dando espaço para as penetrações vindas de trás. No meio, o holandês Schoenmaker fez historia, sendo o artilheiro daquele torneio.


Muitos jogadores viriam a ser chamados para compor o esquadrão da copa de 1974, mas mesmo assim não eram a maioria. O rival viria a ser a base da seleção de Michels, até por ter mais jogadores de confiança.


AJAX 

Existe vida pós-Rinus Michels


Após o título de 1971 da Liga dos Campeões, Michels saiu e colocaram o romeno Stefan Kovacs no lugar. Quem imaginava que o "Futebol Total" iria parar devido a troca de comandante se enganou. O novo treinador, de filosofia diferente de Michels, deu mais liberdade a seus jogadores e viu o time, em evolução constante, atingir o auge do ideal que seu antecessor pensava. Deu mais liberdade para os defensores subirem, sabendo que os meias poderiam cobri-los. Abaixo, as setas mostram perfeitamente as PERMUTAS VERTICAIS que se destacavam:



Ao escolher Blankenburg no lugar do iugoslavo Vasovic, Kovacs adicionou intensidade física e explosão vindo de trás, mantendo Hulshoff como o ultimo homem. Efetivou o então moleque Krol na esquerda e continuou com o bom trabalhador Suurbier na direita, dois laterais que subiam muito para apoiar a frente. No meio, apostou em tres jogadores muito versáteis e de ótima leitura de espaço: Muhren, Neeskens e Haan mantinham a intensidade tanto para fazer a cobertura de eventuais subidas dos homens de trás como para atacar o espaço que os homens da frente liberavam. Na frente, apostou na experiencia do bom Keizer, que buscava bem a bola atrás e gerava espaço livre a  ser atacado e no crescente atacante Johnny Rep, que corria o lado direito todo, abrindo campo para as entradas interiores dos homens de trás.

Notem que está faltando falar do principal: Johan Cruyff. Kovacs foi genial ao dar total liberdade para o craque em campo e desocupar o espaço que supostamente seria do atacante central, dificultando a vida dos zagueiros adversários, que perdiam a referencia de marcação. Sempre dando opção de passe, Cruyff tomou a batuta de vez pra si e explodiu como gênio, atuando em todas as faixas do campo. 

"Cruyff vindo buscar bola atrás (verde) gerando espaço na frente"

Com o "Futebol Total" estourado, Ajax dominou o continente nos dois anos consequentes e se tornou tri-campeão europeu. Inclusive uma partida pode-se destacar entre as demais por ver a pureza do modelo de jogo. Final de 73, Juventus e Ajax. Domínio total do meio campo, laterais trocando de lado, ultrapassando, zagueiro central com 3 finalizaçoes a gol, Neeskens e Cruyff se multiplicavam no campo. ARTE!

No final de 1973, apos a saida de Kovacs, a magia começou a cair. Numa eleição para capitão, Cruyff perdeu para Keizer e, insatisfeito, viria a sair da equipe e seguir os passos de seu mestre indo para o Barcelona.

Os frutos da semente que Michels ajudou a plantar estavam sendo colhidos, mas ainda não era o pico. Precisava-se fazer o mundo saber do projeto. Todo o conceito desenvolvido, a arquitetura perfeita dos espaços do campo, abrindo-o quando atacavam e diminuindo-o quando defendiam, as intensas trocas de posições, o pressing, tudo isso seria utilizado mais a frente. Por ja conhecer grande parte dos jogadores e querer implantar o sistema na equipe, quando o técnico foi para a seleção, fez do Ajax a base da equipe.

Mas engana-se quem pensa que mesmo com essa safra toda de Ajax e Feyenoord, a seleção holandesa ia bem nesse período entre 1970 e 1973...

SELEÇÃO 

Mal das pernas

Após a não-classificação para a copa de 1970, a federação holandesa contratou o tcheco Frantisek Fadrhonc para assumir o lugar do alemão Georg Kessler. Estreou em 1970 mesmo com uma derrota para a Iugoslavia por 1 a 0 nas preliminares para a Eurocopa. Seguindo os padrões das duas principais equipes do país, nos dois primeiros anos, começou com um 4-2-4 e ao perceber que perdia meio campo com isto, utilizou um 4-3-3 com duas variações:

"Notem como fica somente 2 no setor de meio, que acabam se sobrecarregando"






















Já nas duas variações de 4-3-3, o tcheco moldou o time segundo o posicionamento de seu craque Cruyff. Quando o utilizava pelo centro, fazia que nem Michels e Kovacs e dava liberdade de atuação por todo o campo. Quando utilizava um centroavante, o posicionava ao lado direito, ja que Keizer era absoluto do lado esquerdo.

Com a decaída de alguns jogadores e o crescimento de outros, entre eles Rep, Haan e Resenbrink, a base foi mudando. Com o vistoso futebol do Ajax e o estilo de jogo vitorioso do Feyenoord, a cobrança sobre o treinador aumentou, já que passados dois anos, poucos resultados vieram. A não-classificação para as fases finais da Eurocopa de 1972 até ameaçou ele no cargo, mas a federação decidiu mante-lo.

Durante todo 1973, se realizaram as eliminatórias para a Copa de 74. Vitórias vieram e resultados foram eficientes para uma classificação indiscutível. Porém faltava algo mais. Faltava um futebol vistoso, bonito, que a dupla Ajax-Feyenoord conseguiram trazer ao futebol holandes. Õ objetivo era o tão sonhado titulo mundial. A tacada de mestre da federação foi demitir o treinador tcheco para trazer logo o cara que implantou no Ajax a ideia de "Futebol Total". Rinus Michels foi chamado e assumiu em conjunto a seleção e o Barcelona, coisa para poucos. Como que a equipe foi montada, porque ele escolheu cada um dos 22 jogadores? Próximo post falarei tudo. Abraços!

Fontes de pesquisa:

http://imortaisdofutebol.com/2013/07/20/esquadrao-imortal-feyenoord-1968-1974/
http://rdfc.com.ne.kr/int/ned-intres-1970.html
http://timhi.wordpress.com/2010/09/17/aja-1973/
http://imortaisdofutebol.com/2012/04/10/esquadrao-imortal-ajax-1970-1973/
http://www.theguardian.com/football/blog/2013/may/22/great-european-cup-teams-ajax
http://wp.clicrbs.com.br/prelecao/2010/03/02/o-futebol-total-do-carrossel-holandes/