quinta-feira, 20 de março de 2014

ESPECIAL – Rivaldo, um craque na técnica e na tática


15 de março de 2014, o dia em que um dos maiores craques contemporâneos do futebol brasileiro e mundial anunciou a sua aposentadoria.

Rivaldo, o meia-atacante pernambucano que surgiu nos gramados jogando na juventude pelo Paulistano, e, indo logo em seguida profissionalmente para o Santa Cruz, onde se destacou, e foi transferido para o Mogi Mirim, onde brilhou no “Carrossel Caipira”.

João Elias Cruz definiu muito bem o “Carrossel Caipira” campeão da série A2 do Campeonato Paulista em 1992, destacando a importância tática coletiva e individual de Rivaldo: “O esquema tático era um 3-5-2, como o próprio Vadão disse em uma entrevista ao Lancenet, onde Rivaldo era um atacante com muita mobilidade para sair da área, circular pelos lados e recuar para o meio. Como o técnico frisou, foi um esquema inovador para a época, pois havia uma constante troca de posições, mobilidade e aproximações entre os setores do campo. Guardada as devidas proporções, na fase ofensiva era muito semelhante taticamente ao “Carrossel Holandês” do Mundial de 1974.”.

Muitos dizem que Rivaldo era um meia, mas foi o contrário. Rivaldo sempre rendeu jogando mais próximo da área, como André Rocha, do blog Olho Tática da ESPN Brasil disse: “Rivaldo foi um excepcional atacante que insistiu o quanto pode para ser meia. Mesmo rendendo infinitamente mais da intermediária ofensiva em direção à área adversária do que voltando para tentar organizar as jogadas”

No Corinthians de 1993 que fizera ótima campanha com Mario Sérgio no comando técnico, Rivaldo, atuando onde gosta, quase como um atacante, próximo da área, encostando nos jogadores da frente, ele foi destaque e recebeu a Bola de Prata da Placar.

Em 1994, com a parceria Palmeiras-Parmalat em seu auge, a transferência para o alviverde foi inevitável. Campeão Paulista de 1994, Rivaldo era um jogador de meio de campo que virava quase que um atacante, por se aproximar dos atacantes, ou se tornar um deles, já que a obrigação de armar cabia a Zinho ― no meio de campo do 4-2-2-2, que muitas vezes se assemelhava até a um 4-3-3 em fase ofensiva ―.

Em 1996, no time campeão paulista com mais de 100 gols marcados, o posicionamento do 4-2-2-2 de 94 foi mantido. Com Rivaldo próximo da área, Muller abria pela esquerda ― assim como no São Paulo de Telê Santana ― e abria espaço para as chegadas de Rivaldo para encostar-se à linha de frente, ou até compor ela, e Djalminha assumia a função de armar.

Ainda em 96, a transferência para o La Coruña, posicionado como um meio de campo aberto pela esquerda, Rivaldo tinha a liberdade de encostar-se à área e ficar perto dela, e movimentar-se.

Com 21 gols marcados em 42 jogos disputados na temporada, Rivaldo chamou a atenção do Barcelona, e assim se transferiu para o time catalão, onde ganhou maior destaque internacional, e se tornou posteriormente o melhor jogador do mundo em 1999.

Com Louis Van Gaal no comando, Rivaldo queria jogar com mais liberdade ofensiva, tanto de movimentação, infiltração e recuo, o que era motivo de briga dele com o treinador holandês, que o escalava na ponta-esquerda do 4-3-3 catalão, obrigando-o a atuar mais perto da área.

Rivaldo aberto pela esquerda. (Reprodução: Viasat Fotboll)


Mas é fato que Rivaldo foi mais atacante que meia. E André Rocha, mais uma vez participando deste texto, define: “Na seleção, o primeiro a perceber que Rivaldo era mais atacante que meia foi Vanderlei Luxemburgo, em 1999. Especialmente no amistoso contra a Argentina em Porto Alegre. Ronaldinho voltava para armar e Rivaldo ficava mais a frente. Ideia que Felipão seguiria em 2002, e Rivaldo viveu seu auge como jogador de futebol. Com desempenho superior ao de 1998, quando foi meia e atacante na desorganizada seleção de Zagallo”.


Flagrante tático da seleção de 2002. Sem a bola, Ronaldinho e Rivaldo ficavam mais alinhados, mas em fase ofensiva o camisa 10 encostava em Ronaldo, enquanto que Ronaldinho Gaúcho armava.

Mas ainda com Zagallo, nos Jogos Olímpicos de Atlanta, em 96, Rivaldo era o armador pela esquerda do 4-2-2-2, onde era obrigado a recuar demais para armar. Resultado: Atuação desastrosa nas semifinais do torneio olímpico diante da Nigéria ― que mais tarde receberia a medalha de ouro ―, marcada por passes errados, e a perda da bola, resultando assim no segundo gol africano, que seria crucial para a vitória Nigeriana por 3 a 3, com o gol de ouro de Kanu na prorrogação.

Antes da Copa de 2002, Rivaldo assinou com o Milan, onde a passagem fora apagada, assim como fora no Cruzeiro posteriormente em 2004. Não foi nem sombra do Rivaldo em seu auge.

Em 2004 foi à ida de Rivaldo para a Grécia, onde se tornaria ídolo. De início, Rivaldo foi colocado longe do gol no meio de campo do 4-2-2-2 do Olympiakos. Mas na temporada seguinte, como o atacante de mais movimentação do 4-1-3-2, ele se destacou sendo o artilheiro do Campeonato grego, atuando assim mais próximo da área, onde rende mais.

Ainda na mesma temporada, a ida para o AEK, onde jogou aberto pela esquerda, longe do gol, ou seja, não se destacou.

Rivaldo se transferiu para o Bunyodkor do Uzbequistão, onde se tornou ídolo.

Em 2011, à volta para o futebol brasileiro. Rivaldo vestiu a camisa 10 do São Paulo, e na sua estreia, centralizado, perto do gol, num 4-2-3-1, ele teve atuação de gala com direito a chapéu e gol diante do Linense no Morumbi. 3 a 2, e depois, ele não foi mais tão utilizado por Paulo César Carpegiani, mesmo com os pedidos intensos da torcida perto dele.

Após a saída de Carpegiani, Rivaldo foi usado por Milton Cruz, ajudou o time a se recuperar no Campeonato Brasileiro, e, com Adilson Batista, o camisa 10 atuava centralizado no 4-3-1-2, com a liberdade para encostar-se à área e a dupla de ataque formada por Lucas e Dagoberto. Mas o desgaste físico, e a boa fase de Cícero o fizeram perder vaga, e logo, com Leão, Rivaldo não foi mais usado. A expulsão diante do Palmeiras, na penúltima rodada no Pacaembu foi o marco de sua despedida do Tricolor do Morumbi.

Posicionamento defensivo do 4-3-1-2 de Adilson Batista, percebe-se Rivaldo mais centralizado, enquanto que Dagoberto e Lucas procuravam fechar pelos lados.
Em 2012, Rivaldo foi para o Kabuscorp, da Angola, sendo a maior contratação da história do futebol do país. Se destacou no clube, mas os indícios de sua aposentadoria já estavam por perto.

A passagem pelo São Caetano foi breve, marcada mais por lesões do que gols e assistências, e, em 2014, se tornou jogador e presidente do Mogi Mirim, onde viria a atuar junto do filho. Atuando mais centralizado, guarnecido por duas linhas de quatro em fase defensiva, num 4-2-3-1, e encostando no ataque, esse foi o último ato tático de Rivaldo pelo futebol.

Flagrante tático de um dos últimos atos táticos de Rivaldo, centralizado na linha de 3 do 4-2-3-1, pelo Mogi Mirim.


Para finalizar o texto, deixo uma homenagem feita por alguns amigos: 

Caio Gondo (colunista do site):Rivaldo foi e sempre um dos maiores jogadores brasileiros de futebol. Com inúmeros títulos coletivos, entre eles o título da Copa do Mundo de 2002, e individuais, como o de Melhor do Mundo de 1999, o camisa 10 da Seleção Brasileira das Copas de 1998 e 2002 será sempre lembrado pelo o que fez em campo. Mas, apesar do número 10 em sua camisa, Rivaldo nunca foi um meia armador. Ele foi Rivaldo. Em todos os times em que passou, este jogador foi aquele meia que sabia os momentos corretos para tocar a bola, para conduzi-la e para chutá-la. Mas nunca a sua maior característica foi a enfiada e um passe desconcertante. Rivaldo foi Rivaldo. Se ele não fosse um jogador tão importante para história, Rivaldo não seria tão lembrado até hoje no Santa Cruz, no Mogi Mirim, no Palmeiras, no Barcelona, no Milan e na Seleção Brasileira. Isso só para ficar nos locais onde ele mais se destacou. Rivaldo foi um grande meia canhoto do qual poucos entendiam o que fazia, mas muitos queriam tê-lo em seu time. Obrigado, Rivaldo, por tudo o que fez pelo futebol.


Leonardo Miranda (blogueiro do "Painel Tático", do globoesporte.com): Rivaldo, o craque "sem marketing", figura obrigatória em listas de melhores e mais um a deixar os gramados. Um meia mais atacante e goleador que organizador. Gostava de procurar jogadas na esquerda e ir para a área concluir - como no Palmeiras de 96, num 4-2-2-2 e no Brasil de 2002, num 3-4-2-1 que o deixava solto. Natural que na Europa virasse winger com John Toshack no 4-4-2 do Deportivo La Coruña, apesar do "louco" Van Gaal o colocar na ponta do 4-3-3 onde foi melhor do mundo e até num vértice do 3-4-3 "diamante" que tentou emular o Ajax. As pernas tortas e a timidez deixarão saudades!


Victor Oliveira (colunista do site): "Rivaldo foi um dos maiores jogadores que tive o prazer de acompanhar. Lembro de seu gol feito do meio campo, ainda pelo Mogi Mirim, que o projetou para o Corinthians, depois para o Palmeiras de Luxemburgo e, enfim, para o Barcelona. No time catalão foi fantástico, tanto que foi eleito melhor jogador do mundo no ano de 99. Na Seleção, Rivaldo disputou duas Copas em alto nível técnico: 98 e 2002. Nas duas oportunidades foi, junto com Ronaldo, uma das peças fundamentais, tanto no time de Zagallo quanto no de Felipão na campanha do penta. Podemos dizer que ele honrou a mística da camisa 10 canarinho. Em 98, foi um meia esquerda atuante no quadrado brasileiro. Já em 2002, uma espécie de ponta lança que flutuava atrás de Ronaldo no 3-5-2 montado por Scolari. Um jogador completo no que concerne às funções ofensivas, afinal tinha visão de jogo para criar, velocidade para atuar pelos flancos e um qualidade na finalização que o fez marcar belos gols. No Barcelona, teve alguns problemas com Van Gaal que exigia sua recomposição pelo lado esquerdo, algo que Rivaldo não gostava muito de fazer. Mas, há quase 20 anos atrás o futebol tinha outra concepção tática. Se tivesse em seu auge hoje, Rivaldo, usando como o exemplo o 4-2-3-1, jogaria com excelência como meia central, como extremo, como falso nove e como centroavante. Parabéns pela iniciativa da homenagem Diogo. É muito merecida. Acompanho o futebol desde o início da década de 90 e foi o melhor camisa 10 que assisti atuando pela seleção. Não me esqueço do 4 x 2 contra a Argentina em 99, jogo disputado no Beira Rio. Talvez tenha sido a melhor atuação de Rivaldo com a camisa do Brasil. Deu até saudade de vê-lo atuando com Ronaldo, Roberto Carlos, Cafu...bons tempos!"


Por Diogo Ribeiro Martins (@diogorm013)