A sexta rodada da Premier League foi palco de dois
dos mais tradicionais clássicos do futebol inglês. Após Liverpool e Everton
empatarem por 1x1 no Merseyside Derby,
o Arsenal recebeu o Tottenham no Emirates para o clássico de maior apelo – pelo
menos em termos midiáticos – da cidade de Londres, a verdadeira capital mundial
do futebol.
Arsène Wenger, apesar das críticas que tem recebido
neste início de temporada, voltou ao sistema com três homens no centro do
meio-campo, mantendo Özil na ponta, fora de sua zona de conforto. O alemão
atuou como winger pela esquerda mais
uma vez, com Chamberlain executando a mesma função do lado oposto, enquanto
Alexis Sánchez, poupado, começou no banco. Welbeck voltou a figurar como o atacante
mais avançado na ausência de Giroud, movimentando-se com frequência para abrir
espaço aos companheiros e, ao mesmo tempo, desvincular-se da própria marcação.
Em casa, o Arsenal precisava vencer para não deixar o Chelsea disparar ainda
mais na liderança e, neste sentido, tomou as rédeas da partida e propôs o jogo
desde o início, concentrando a bola nos seus pés, o que fica fácil com um
meio-campo que conta com Arteta, Wilshere, Ramsey e Özil.
O Tottenham, por sua vez, executava uma proposta
claramente reativa que era evidenciada ainda mais pelo forte domínio do meio-campo
por parte do rival. Mauricio Pochettino tem modificado constantemente as peças
da linha de defesa e os volantes, mas repete nos jogos da Premier League o
quarteto ofensivo, formado por Adebayor, Lamela, Eriksen e Chadli, com os três
últimos executando boa movimentação e trocas de posições constantes. No North London Derby, no entanto, o trio
guardou mais posição para não comprometer a transição defensiva e buscava na velocidade
do contra-ataque uma alternativa para levar perigo ao gol de Szczesny.
Com meio-campo extremamente técnico, Arsenal
monopolizou a bola e buscava quebrar as duas linhas de quatro do Tottenham com
a forte movimentação de Welbeck e Chamberlain e a infiltração de Wilshere e
Ramsey
Embora o sistema tático dos Spurs desse a impressão de um 4-2-3-1, a movimentação defensiva e
ofensiva de Chadli mostrava que não era bem assim, já que o belga não voltava
para marcar à frente da segunda linha de quatro e, com a bola na posse dos seus
companheiros, não auxiliava na armação, mas, sim, buscava se posicionar atrás
de Adebayor, enquanto aguardava a movimentação do togolês para atacar os
espaços abertos por ele. Quanto aos volantes, a participação de Capoué nas
jogadas ofensivas se resume à ida para a área para se aproveitar da boa estatura
nas jogadas de bola parada. Ryan Mason, por seu turno, foi bem no meio de
semana pela Copa da Liga e ganhou uma chance na Premier League com a lesão de
Dembélé e os maus momentos de Paulinho e Bentaleb, principalmente. O garoto da
academia do Tottenham aparecia no ataque, mas sua presença era interessante
mais para a superioridade numérica do time nas poucas situações ofensivas que
criava do que propriamente como uma alternativa de ajudar na armação. Mason fez
boa partida defensiva e ajudava na distribuição do jogo a partir de trás, mas,
diferente dos volantes box-to-box tradicionais
do futebol inglês, era bastante ineficiente na chegada ao ataque. Tentou somente um
chute (errado) para o gol, não criou nenhuma chance para os seus companheiros e
efetuou um único cruzamento sem sucesso para a área. Dos passes que tentou,
acertou apenas 69%, sendo a maioria dos acertos no meio do campo e boa parte
dos erros no último terço do relvado. O jovem meio-campista tem qualidades para
chegar perto da área adversária e já demonstrou isso em outras oportunidades,
mas sua participação na fase ofensiva durante o dérbi não foi eficiente.
Mapa de passes de Ryan Mason: muitos erros em zonas
importantes da construção dos ataques, apesar do bom aproveitamento na
distribuição no meio-campo. Passes certos estão em verde e errados em roxo (Reprodução: Squawka)
Já que o homem mais próximo do centroavante e os
volantes pouco participavam da armação, os wingers
acabavam como os principais responsáveis por esta função, o que certamente
é premeditado, já que as maiores qualidades de Lamela e Eriksen estão
justamente nos fundamentos que compõem o processo de construção do jogo. Neste
sentido, o argentino e o dinamarquês recompunham na marcação pelos seus
respectivos extremos do campo e, quando da recuperação da bola, saíam em
velocidade para pensar o jogo para os Spurs
e armar de fora pra dentro.
Tottenham com setores aproximados buscando negar
espaços para os ataques do rival. Posicionamento defensivo era em 4-4-2, mas, com
a bola, sistema era o 4-4-1-1 (Reprodução: Fox Sports)
Nos poucos momentos em que não tinha a bola no pé,
o Arsenal posicionava-se em um 4-1-4-1 para se defender, com Arteta entre as
duas linhas de quatro e Özil e Chamberlain fechando os flancos da segunda
linha. A insistência em Arteta à frente da defesa, mesmo com sua visível queda
de rendimento técnico e físico, justifica-se pela clara falta de confiança de
Wenger em usar uma dupla de volantes box-to-box,
que certamente seria formada por Wilshere e Ramsey sem qualquer proteção, caso
o Arsenal fosse treinado por Brendan Rodgers, por exemplo. Wenger, apesar de
ser tratado como um técnico de visões ofensivas e que se moderniza na medida em
que o futebol evolui, sempre preferiu utilizar um primeiro volante ao lado ou
atrás dos box-to-box. Esse cara já
foi Petit, Gilberto Silva, Flamini, Denílson, Song e, desde as duas últimas
temporadas, tem sido Arteta, que chegou do Everton ao Emirates em 2011-12 como
meia-atacante, caso os que acompanham o futebol inglês há pouco tempo não
saibam.
Linha de meio-campo dos Gunners com a já não mais tão
eficiente proteção de Mikel Arteta (Reprodução: Fox Sports)
Apesar de retraído, o Tottenham tinha dificuldades
para frear os ataques dos Gunners e
também para acertar os contragolpes. Os únicos momentos em que os comandados de
Pochettino conseguiam igualar as ações e assustar os rivais era quando exerciam
marcação pressão na saída de bola adversária. No final do primeiro tempo, o
Arsenal teve problemas de lesão que obrigaram Wenger a promover Flamini e
Cazorla às vagas de Arteta e Ramsey, fazendo o time sair do 4-1-4-1 para o
4-2-3-1 e ter maiores dificuldades na transição ofensiva, pelo menos
inicialmente. Neste momento, os Spurs aproveitaram
para adiantar a marcação e pressionar no campo ofensivo, criando as principais
chances do time no jogo. O mesmo aconteceu no início da segunda etapa e foi em uma
dessas situações de pressing que o
time azul conseguiu seu gol, com Eriksen roubando a bola de Flamini na
intermediária e Lamela aparecendo na sequência para servir Chadli que, em
progressão no espaço vazio, recebeu e deslocou Szczesny para abrir o placar.
Momento da roubada de bola de Eriksen que originou o
gol do Tottenham (Reprodução: Fox Sports)
Com o resultado favorável, o Tottenham abdicou das
esporádicas situações de pressão e se retraiu ainda mais, aguardando o Arsenal
no seu campo. Os Gunners, por sua
vez, continuaram martelando e esbarrando no goleiro Lloris, de atuação
primorosa. Wenger, então, utilizou sua última cartada, que foi colocar Sánchez
no lugar de Wilshere, recuar Cazorla para fazer dupla de volantes com Flamini e
agredir pelas duas pontas. A vantagem de ter dois atacantes agressivos pelos
lados do campo, além da amplitude, está no sentido de ter mais homens com
instinto goleador para completar as jogadas. Exemplificando: quando Chamberlain
cria uma ocasião de linha de fundo pela direita e Özil está posicionado como
ponta-esquerda, o alemão não tem cacoete de entrar na área para dar opção de
finalização. Por outro lado, quando Chamberlain e Alexis são os wingers, se um cria por um flanco, o
outro automaticamente aparece por dentro para dar alternativa de conclusão
junto ao centroavante. E foi neste sentido que o gol de empate saiu, com jogada
criada por Sánchez pela esquerda e concluída por Chamberlain dentro da pequena
área.
Mauricio Pochettino manifestou contentamento com o empate
após o jogo, mas a entrada de Bentaleb no lugar de Chadli, que provocou a
estruturação de um 4-1-4-1 altamente retraído, é uma demonstração de satisfação
com o resultado mais contundente do que qualquer declaração que o técnico
argentino pudesse dar.
Arsenal tentou o resultado até o final, enquanto o
Tottenham não pareceu triste com um empate na casa do maior rival
Na perseguição ao Chelsea, líder inconteste e
próximo adversário na Premier League, o Arsenal não ficou feliz com o empate,
que aumentou sua diferença com relação ao topo da tabela para seis pontos. Os Gunners ainda têm Champions League, onde
foram derrotados na primeira rodada e terão partida importantíssima no meio de
semana. O Tottenham, por sua vez, mesmo tendo pretensões mais modestas na
temporada e com a demonstração de satisfação por parte do seu comandante com o
resultado do clássico, precisa ligar o alerta, pois chega à quarta partida sem
vitória e, pior, apresentando um futebol muito pobre, bem abaixo do que o
elenco dos Spurs pode oferecer e do
que Mauricio Pochettino demonstrava com o Southampton na última temporada, onde
tinha um elenco muito mais limitado em termos técnicos e de quantidade.