O Figueirense recebeu, no Orlando Scarpelli, o
último time de uma sequência de três adversários paulistas que mediram forças
com o Furacão do Estreito. O Palmeiras, vindo de vitória, buscava no duelo
contra o Figueira iniciar a tão sonhada regularidade para fugir da famigerada
“zona da confusão”.
A chuva que tem caído sobre a Grande Florianópolis nos
últimos dias era um fator que atrapalhava os dois times, já que o Palmeiras tem
na velocidade pelos lados sua principal característica e o Figueirense é um
time que mantém a posse de bola e gosta de trocar passes no meio-campo enquanto
aguarda pelo momento certo de acelerar o jogo com os laterais e os atacantes.
Para o confronto contra o Palmeiras, Argel Fucks manteve
a coerência que lhe é peculiar e repetiu a estrutura do time que venceu bem o
Corinthians, em um 4-4-2 com a armação sendo feita a partir dos extremos. A
ausência de França, impedido por motivos contratuais de atuar contra o Verdão,
detentor de seu passe, fez com que Argel cogitasse a volta ao 4-2-3-1, mas o
técnico acabou preferindo a entrada do volante Jefferson, garoto da base, para
executar função parecida com a de França no meio-campo.
Dorival Junior mais uma vez não conseguiu repetir o
time, mas manteve a conjuntura tática e contou com a importante volta de
Marcelo Oliveira ao meio-campo. O volante/zagueiro/lateral é um dos poucos
pilares do desestruturado Palmeiras da temporada de 2014 e forma boa dupla com
o jovem Renato. O 4-2-3-1 palestrino tinha Valdívia dando o ritmo no meio-campo
e Cristaldo e Diogo trabalhando pelas pontas. Nesta via, a movimentação de
Henrique era fundamental para carregar a marcação e abrir espaços para a
entrada em diagonal dos atacantes de lado, que, por sua vez, abriam o corredor
para os promissores laterais João Pedro e Victor Luís buscarem a linha de
fundo.
Figueirense armado em um 4-4-2 que valorizava a posse
da bola e Palmeiras usando Valdívia como uma espécie de “mestre de bateria”.
Era o “Mago” quem decidia a hora de acelerar ou controlar a bola
O Figueirense teve ótima atuação defensiva no meio
de semana contra o Corinthians, com destaques individuais que foram possíveis
graças à compactação que impedia o adversário de romper as linhas de marcação.
Contra o Palmeiras, no entanto, o comprometimento tático que se viu de Marco
Antônio e Giovanni Augusto na quarta-feira não se repetiu, principalmente da
parte do camisa 10, que voltava apenas esporadicamente e deixava Marquinhos
Pedroso exposto com frequência, obrigando os volantes ou zagueiros a deixarem
suas posições para executarem a cobertura enquanto o lateral era forçado ao
combate. Isto evidencia que, para um sistema defensivo obter sucesso, é
necessário que todos os que fazem parte dele executem sua função com correção,
caso contrário, todos os outros jogadores precisam compensar essa ausência, o
que desestrutura totalmente o plano inicial.
Palmeiras cobra lateral pela esquerda e as linhas de
defesa e meio-campo do Figueirense balançam para o lado da bola, com exceção de
Giovanni Augusto, que se limita a marcar o lateral-direito João Pedro e compromete
a compactação defensiva da equipe (Foto: João Marcos Soares/A Prancheta Tática)
Os jogadores de Dorival Junior tinham funções
definidas dentro de campo nas fases ofensiva e defensiva, quando os pontas
voltavam para fechar uma linha de quatro com os volantes e Valdívia e Henrique
permaneciam mais avançados. Vez ou outra era possível observar um dos dois
voltando até a intermediária defensiva para ocupar espaços, mas, em geral,
ambos permaneciam com o cargo de dar o primeiro combate na saída de bola do
Figueirense, que perde um pouco de qualidade quando Marco Antônio atua mais à
frente.
4-2-3-1 palestrino em transição para o 4-4-2 da fase
defensiva, quando Cristaldo e Diogo se alinhavam aos volantes e Valdívia, ao
centroavante (Foto: João Marcos Soares/A Prancheta Tática)
Durante o primeiro tempo, o Figueirense não
conseguia criar e o Palmeiras era objetivo quando tinha a bola no pé. O time de
Dorival mantém menos posse do que seus adversários e foi assim contra o
Figueirense e até no triunfo em casa contra o Vitória. Neste sentido, a figura
de Valdívia em campo é de extrema importância para que as poucas jogadas de
ataque do time alviverde não sejam desperdiçadas, já que o chileno tem uma
visão diferenciada do jogo e o organiza como poucos no futebol brasileiro
atualmente. Mesmo quando não tem grande atuação, o capitão palestrino é
importante, sobretudo pela forma de jogo que Dorival elegeu para trabalhar no
Palmeiras.
O Palestra não sofreu sustos na primeira etapa e
conseguiu abrir o placar após jogada de linha de fundo executada por Diogo, em
um dos poucos momentos de brilho do camisa 17, que encontrou Cristaldo para
marcar. O argentino é centroavante de origem e se posiciona muito bem para dar
opção tanto em profundidade quanto dentro da área para as jogadas de lado. Seu
deslocamento da pequena área para a marca do pênalti confundiu Marquinhos
Pedroso, que o perdeu de vista e permitiu ao camisa 9 finalizar livre.
O gol abalou o Figueirense e fez com que o time
catarinense se perdesse ainda mais na partida. Argel percebeu o momento e, como
fez contra o Internacional no Beira Rio, mudou o time no finzinho do
primeiro tempo, promovendo Marcão para que o centroavante esquentasse e o time já fosse se
acostumando com uma formação diferente. O escolhido para sair foi o jovem
Jefferson, que não fazia má partida, mas era a opção mais viável para que o
Figueira voltasse ao 4-2-3-1. Desta forma, Marco Antônio voltou a atuar como
volante ao lado de Paulo Roberto, Giovanni Augusto saiu da ponta-esquerda e
passou a ser o meia central de uma linha de três, que era completada pelos
atacantes Pablo e Everaldo, fazendo o alvinegro se estruturar de maneira
parecida com o adversário, que também tinha dois atacantes agressivos pelos
extremos do campo.
Figueirense no 4-2-3-1, com Giovanni Augusto de volta
ao centro do meio-campo e Marco Antônio voltando a trabalhar como volante (Foto:
João Marcos Soares/A Prancheta Tática)
As mudanças não surtiram efeito inicialmente e o
Palmeiras continuou com a partida sob controle durante a primeira metade do
segundo tempo, chegando inclusive a desperdiçar duas chances claríssimas de
matar o jogo. Uma em contra-ataque puxado por Valdívia, que encontrou Cristaldo
em progressão pela direita, mas o argentino parou no goleiro Tiago Volpi. A
outra grande oportunidade foi o momento mais emblemático do confronto, quando Marcelo
Oliveira chegou ao ataque e fez bela triangulação com Cristaldo e Valdivia, e o
chileno, na cara de Volpi, preferiu não chutar e tocou de lado buscando
Henrique, mas Marquinhos Pedroso estava na jogada e efetuou o corte. O lance
tem sido tratado como displicente e irresponsável da parte de Valdívia, que
assumiu e se desculpou pelo vacilo ao final do jogo, mas o mais importante para
entender o contexto da partida, é que a jogada marcou o ponto de ruptura na
péssima atuação do Figueirense, que passou a colocar a bola no chão e buscar o
ataque com maior efetividade a partir daí.
Argel, que já havia colocado Clayton no lugar de
Pablo, substituiu Everaldo pelo estreante Mazola, que chegou ao Figueira
durante a Copa do Mundo, mas não havia entrado em campo ainda principalmente
por dificuldades de entrar em forma fisicamente. Clayton e Mazola jogam mais
com a bola no pé do que Pablo e Everaldo e partem pra cima dos adversários
sempre que podem. A agressividade que o time passou a ter coincidiu com a maior
efetividade de Giovanni Augusto, que vinha tendo atuação bastante irregular até
o momento, mas liderou mais uma virada sensacional do Figueira.
Em cinco minutos, o time catarinense fez três gols
em jogadas de bola aérea muito bem trabalhadas pelos lados do campo. O empate até
pode ser considerado fortuito, já que o time ainda não havia ensaiado uma
pressão e Marquinhos Pedroso encontrou grande cruzamento na cabeça de Clayton.
O gol serviu pra acordar a torcida, que empurrou demais a equipe na sequência e
criou uma atmosfera espetacular no Orlando Scarpelli, impulsionando o time à
virada. Giovanni Augusto fez boa trama pela esquerda e deu a assistência para o
segundo gol de Clayton. O camisa 10 ainda fez linda jogada pela direita,
aplicando um chapéu no defensor palmeirense para depois encontrar Leandro Silva
em progressão para a linha de fundo. O lateral cruzou e Marcão, de cabeça,
sepultou o resultado.
Dorival ainda tentou frear a reação do Figueira com as
entradas de Allione e Bernardo, mas o abalo emocional do alviverde era evidente
Mesmo após os três gols, o Figueirense continuou
atacando e o rival sequer ensaiou qualquer reação. O Verdão dominou quase toda a partida, mas os 15 minutos
de excelente futebol que o Figueira apresentou no Scarpelli foram suficientes
para bater um Palmeiras que está se especializando em decepcionar seu torcedor
de todas as maneiras possíveis neste Brasileirão. O time catarinense chega à décima colocação e abre sete pontos para o próprio Palmeiras, primeiro clube na zona do rebaixamento.
A vitória catarinense se deve à ousadia de Argel
Fucks, que observou bem a dificuldade que seus comandados estavam enfrentando
em campo e modificou esquema e peças com inteligência. O treinador merece ser
melhor observado dentro do futebol brasileiro que tanto clama por uma
renovação, inclusive no aspecto tático. O Figueirense, que tem time limitado,
varia e muito nas mãos de Argel, transitando por sistemas diferentes, mas sem
perder sua cara e as características de seu jogo.
Por João Marcos Soares (@JoaoMarcos__)