terça-feira, 23 de setembro de 2014

Joel escala o melhor Vasco desde que reassumiu, mas só consegue vencer no abafa

Após dois empates consecutivos no comando do Vasco, Joel Santana tentou modificar a escalação inicial a fim de recuperar o domínio do meio-campo que perdeu contra Atlético-GO e Oeste.

Nas primeiras três partidas do novo velho técnico, o Vasco atuou num 4-3-1-2, com Maxi Rodríguez se posicionando ao lado de Kleber no ataque, mas eventualmente se juntando a Douglas para participar também da criação, por questão de característica. A entrada de Thalles no lugar de Aranda para o confronto contra o Náutico fez com que o uruguaio fosse deslocado do ataque para a linha de volantes do esquema tático que foi mantido. Anteriormente, com Fabrício, Guiñazu e Aranda no meio, o Vasco tinha extremas dificuldades na criação.

No ataque, Maxi Rodríguez não conseguia dar a profundidade necessária, já que tem pouca velocidade e está acostumado a dar o último passe e não a recebê-lo, além de não se entender com Kleber, pelo menos em termos de movimentação. Um não abria espaço para o outro e quase não se via aproximação para tabelas entre os dois.

Já o Náutico entrou no 4-1-4-1, com alternância de bloco médio para bloco baixo na marcação, por vezes tendo uma compactação mais longa, entre as intermediárias, com a linha de meio adiantando-se para a intermediária defensiva adversária, porém o Vasco achava espaços para sair jogando nessa situação sem grandes dificuldades.

Linha de quatro do meio alvirrubro tenta subir a pressão e o lateral do lado da bola sobe o encaixe no jogador do Vasco que recua para oferecer linha de passe no setor ao portador da bola. Repare o espaço entre o volante do entrelinhas e a linha de quatro. Quando o Náutico subia a marcação e o Vasco conseguia ultrapassá-la, sempre encontrava espaços para progredir em campo defensivo adversário (Reprodução: Rede TV)


Com Maxi na linha dos volantes, Vasco teve amplo domínio durante o primeiro tempo contra o Náutico, armado em um 4-1-4-1

O Vasco que foi a campo contra o Náutico marcava em bloco médio alternando com situações eventuais de pressão, quando do adiantamento dos laterais para a linha dos volantes e de Douglas para marcar alinhado aos atacantes. Quando não pressionava, o Vasco tinha sua linha de volantes balançando corretamente de acordo com a posição da bola e dificultando a virada de jogo do Timbu. A recomposição defensiva, apesar de espaço relativamente longo entre as linhas, era rápida e eficiente, minimizando, assim, a preocupação inicial dos menos otimistas com relação à opção por Maxi Rodríguez com mais responsabilidade de marcação.

Em fase ofensiva, Maxi e Douglas organizavam os ataques pelo meio e Kleber e Thalles procuravam movimentar-se à frente para abrir espaços e dar profundidade, enquanto Guiñazu e Fabrício guardavam posição junto com os zagueiros para guarnecer o sistema defensivo, abandonado pelos laterais, que afundavam nas pontas para dar amplitude pelos lados. A forma de jogo vascaína contra o Timbu não tem nada de moderna – compreensível em um time de Joel Santana –, mas se mostrou interessante e fez o Vasco dominar as ações do primeiro tempo.

De volta aos anos 90: conjuntura de ataque do Vasco da Gama. Laterais virando pontas, dois meias de criação e dois atacantes. “Old school”, “vintage”, “retrô”... escolha o adjetivo para caracterizar o melhor Vasco de Joel até aqui (Reprodução: Premiere)

Além da ajuda a Douglas na criação, Maxi Rodríguez mais recuado propiciava uma melhor saída de bola para o cruzmaltino e uma transição ofensiva um pouco mais veloz, já que, quando o time recuperava a posse no primeiro terço do campo, o uruguaio era quem buscava a bola para acelerar a transição e organizar a melhor jogada. Guiñazu não erra passes na intermediária defensiva, mas dificilmente arrisca e não é o jogador mais indicado para estruturar os ataques a partir de trás. Com Adílson Batista e no início do trabalho de Joel, Douglas via-se obrigado a voltar ao campo defensivo para buscar a bola, saindo do entrelinhas, onde encontra mais espaço para procurar o passe de ruptura. À vontade no seu setor, Douglas acabou sendo o principal destaque individual do Vasco no primeiro tempo.

Maxi buscando a bola para pensar o jogo a partir de trás (Reprodução: Rede TV)

Quando a posse era recuperada ainda no meio-campo, Maxi saída da linha de volantes e invadia o entrelinhas, atrapalhando o 4-1-4-1 do Náutico, que tinha encaixes por setor e Paulinho posicionado entre a linha de defesa e a do meio-campo para vigiar Douglas. O advento de Maxi Rodríguez no setor de Paulinho dava superioridade numérica ao Vasco e desestruturava a marcação alvirrubra.

Maxi recebe passe de Guiñazu entre as linhas adversárias e com espaço para avançar (Reprodução: Rede TV)

Com tal estrutura tática e 63,5% de posse de bola, o Vasco trocou 429 passes durante a partida – a média da Série B é de pouco menos de 310. Os passes trocados estão dentro da alta média do clube cruzmaltino na competição, que é de 423, a diferença é que, a opção por Maxi no meio-campo ao invés de Aranda ou Pedro Ken, deu ao Vasco um melhor índice de acerto no quesito. Contra o Náutico, o time da Colina, que erra 38 passes por jogo em média, falhou em apenas 29 oportunidades, alcançando uma boa média de 93% de acerto no fundamento.

Mapa de movimentação de Maxi Rodríguez, que dominou o lado esquerdo da defesa ao ataque (Reprodução: Footstats)

Em bloco baixo, o Náutico de Dado Cavalcanti também tinha dificuldades para se compactar. O Vasco sempre encontrava espaços para encaixar o passe vertical entre as linhas e virar o jogo de um lado pra outro, sendo favorecido pela marcação frouxa e pouco agressiva dos volantes do Náutico mais ao centro e o atraso dos wingers para fechar o espaço pelos lados do campo à frente dos laterais e também para bascular pro lado atacado por vezes. Tinha proposta claramente reativa, marcando predominantemente atrás da linha da bola e buscando a saída em velocidade no contragolpe. E foi no contra-ataque que o time pernambucano saiu na frente.

Apesar de todos os indicativos apontarem que o Vasco tinha o melhor desempenho desde que Joel Santana assumiu, o “Papai”, pressionado pelo insistente 0x0, apesar da grande quantidade de chances criadas, resolveu ser ainda mais Joel Santana e colocar outro atacante em campo. O técnico tem enchido o time de atacantes quando precisa do resultado, como se isso fosse sinônimo de ofensividade. O mais estranho é que a entrada de Edmílson foi justamente no lugar de Maxi Rodríguez, a peça que encaixou o esquema e que proporcionava ao Vasco uma organização interessante nas jogadas de ataque e na recomposição defensiva. A entrada de Edmílson fez o Vasco perder o meio-campo e, com isso, passou a sofrer com as investidas de Sassá e Crislan, os homens que dão profundidade ao Náutico. Minutos após a substituição, Crislan recebeu em progressão e foi derrubado por Martin Silva, em pênalti convertido por Sassá.

No lance do gol do Náutico, o lateral-direito do Vasco subiu pressão no portador da bola, deixando espaços às suas costas na linha defensiva. Crislan fez a diagonal curta, atacou esse espaço e o zagueiro não conseguiu fechar a cobertura (Reprodução: Premiere)

Desesperado pela possibilidade do terceiro jogo sem vitória, Joel continuou colocando jogadores de característica mais ofensiva: Marlon no lugar de Lorran e Dakson no de Fabrício. Com a vitória parcial, o Náutico adotou uma proposta ainda mais reativa e se fechou em seu campo. Já o Vasco, totalmente desorganizado, foi pro abafa e graças a duas jogadas de Thalles pela ponta direita, conseguiu os gols que proporcionaram a virada, marcados por Dakson e Kleber.

Desorganizado, Vasco foi pro abafa e conseguiu uma virada sem méritos

Gol de empate do Vasco, que ataca pela direita, um dos zagueiros fecha com o atacante no centro da área e o lateral oposto fecha com Kleber na segunda trave, porém, repare no posicionamento do defensor do Náutico, na entrada da área. Sem referência nenhuma de marcação. Dakson inteligentemente infiltrou de trás, atacou o vazio e entrou livre pra escorar (Reprodução: Premiere)

A partida contra o Náutico, que iniciou promissora, acabou com vitória, mas com decepção com a atitude do técnico vascaíno no segundo tempo. Pelo lado positivo, o jogo mostrou que Joel Santana ainda consegue montar um time organizado, ao seu estilo, é claro, mas que pode ser competitivo dentro de uma Série B de nível muito baixo. O problema é que, quando não consegue os gols, Joel se desespera e vê o abafa como única solução. Deu certo contra o Náutico, mas não deve ser sempre assim e, em 2014, o vamo-que-vamo não pode se sobressair em detrimento da organização.

*Dados estatísticos retirados do Footstats

Por João Marcos Soares (@JoaoMarcos__)
Colaboração de João Elias Cruz (@Joaoeliascruzzz)