sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Com propostas diferentes, Flu e Galo não saem do zero no Maracanã

Em mais um dos confrontos diretos da rodada, o Atlético-MG foi ao Rio de Janeiro enfrentar o Fluminense. Com um público novamente decepcionante no Maracanã, o time mandante foi a campo com vários desfalques, sobretudo no setor da defesa, assim como o adversário, que sofre com lesões há vários meses e a cada novo jogo precisa fazer mudanças com relação ao anterior.

Cristovão Borges repetiu seu esquema preferido e, apesar dos desfalques, tinha todos os titulares do setor mais avançado, importantíssimos para a forma de jogo que o treinador adotou desde que chegou às Laranjeiras, com toques rápidos no último terço do campo e constante movimentação, sobretudo entre os homens que jogam atrás do centroavante. A volta de Fred, após o descanso pós-Copa, fez o Fluminense voltar a atuar com a referência na frente, o que, apesar dos esforços do capitão tricolor ao tentar se movimentar mais fora da área, foi prejudicial para o estilo de jogo que o Flu apresentara com Rafael Sóbis como homem mais avançado.

O visitante foi organizado por Levir Culpi em um 4-4-2 que tinha características muito semelhantes às do time que venceu o clássico contra o Cruzeiro há algumas rodadas. Proposta reativa com linhas compactas e alta velocidade na transição ofensiva, seja em contra-ataque com toques curtos ou através de lançamentos longos para os homens mais avançados, que sempre se posicionavam no limite das linhas adversárias para dar profundidade e apostar corrida com a lenta e remendada defesa tricolor.

 Fluminense no 4-2-3-1 tradicional da temporada e Atlético postado em um 4-4-2 que marcava em bloco baixo e apostava na velocidade do contragolpe

Nos podcasts que sempre fazemos nas prévias das rodadas do Brasileirão, temos alertado para a forma parecida que os rivais mineiros Atlético e Cruzeiro atuam, em um 4-2-3-1 que propõe o jogo e que apresenta intensa movimentação ofensiva, com linhas espaçadas na fase de marcação. No jogo contra o Internacional, o Cruzeiro quebrou este paradigma e teve uma boa recomposição defensiva, com Everton Ribeiro deslocado para o centro e Marquinhos e Willian demonstrando comprometimento com a marcação, ao fazerem a transição defensiva rapidamente, não só acompanhando o lateral adversário. O Galo, por sua vez, teve linhas rígidas e compactas no clássico contra o Cruzeiro e voltou a apresentar esta característica na visita ao Maracanã de quinta-feira.

Com o time mandante tendo a bola e propondo o jogo, Levir Culpi optou por aproximar suas linhas de marcação e dificultar a movimentação com a bola dos atacantes adversários em seu terço defensivo. Luan e Carlos voltavam pelos extremos e Leandro Donizete e Dátolo trabalhavam pelo centro, sempre aplicados na busca pela recuperação da bola e organizando a transição ofensiva do time. Além da rigidez das linhas, a marcação mineira também se caracterizava pela agressividade ao portador da bola por parte do atleta da linha de meio-campo atleticana mais próximo. Sem a bola, Jô e Guilherme atrapalhavam a saída dos zagueiros inicialmente e, posteriormente, dos volantes tricolores. Com a bola, ambos buscavam ficar na última linha da defesa adversária para dar opção de profundidade aos lançamentos longos dos volantes e de Marcos Rocha. A alternativa era interessante, mas a possibilidade de sucesso era remota se comparada à quantidade de tentativas. Foram cinquenta e seis lançamentos dos jogadores atleticanos, sendo apenas vinte e cinco corretos. Além da enorme possibilidade de erro, havia também o risco de estarem sempre em impedimento pelo posicionamento no limite. Mesmo tendo menos posse no terço de ataque do que o Fluminense, os atletas do Galo ficaram nove vezes em impedimento, contra apenas uma do adversário. Algumas das marcações foram equivocadas ou duvidosas e o único impedimento para o Fluminense foi muito mal apontado pela assistente Nadine Câmara Bastos, de Santa Catarina, que levantou a bandeira incorretamente em no mínimo duas ocasiões claras de gol, uma para cada lado.

Linhas mineiras bastante próximas dificultavam o trabalho ofensivo do time mandante (Reprodução: Premiere)

O Fluminense foi fiel à sua forma de jogo, apesar de ter dificuldades para aplicá-la. Edson era o volante mais preso, mas também contribuía para a troca de passes no campo adversário. Rafinha também ajudava na saída de bola e chegava bem no ataque. Mais à frente, Wágner, Conca e Cícero transitavam com bastante liberdade com a posse de bola, procurando furar o aplicado sistema defensivo do Atlético-MG por meio de trocas de passe curtas. A posse de bola do Flu foi um pouco maior, com 55,8% do tempo com a bola nos seus domínios, mas o que realmente impressionava era a quantidade de passes trocados pelo time carioca com relação ao mineiro. Foram 498 tentativas de passes por parte do tricolor das Laranjeiras, com excelentes 94% de acerto, contra 277 do Galo, com 87% de aproveitamento.

 Fluminense em seu 4-2-3-1 na formação prioritária, com Wágner e Cícero fechando os flancos alinhados a Conca e não aos volantes compondo uma segunda linha de quatro, como é mais comum (Reprodução: Premiere)

O jogo não foi dos mais interessantes do ponto de vista técnico, mas não se pode dizer que o time da casa não tentou impor seu estilo e buscar a vitória. Cristovão Borges tenta realmente fazer algo diferente com o que tem em mãos, mas sofre pelo elenco enxuto, que tem poucas alternativas de qualidade do meio pra trás e ainda sofre constantemente com lesões. Do meio pra frente, o técnico tem atletas do mais alto nível para os padrões do futebol brasileiro, mas com características semelhantes, e a falta de um jogador de velocidade que atue em uma das posições mais avançadas engessa o treinador a esta forma de jogo e o impede de poder aplicar alguma variação que permita ao Flu se adaptar aos diferentes adversários. Contra um Atlético-MG com as linhas de marcação rígidas e compactas, a lentidão dos quatro homens de frente, que são jogadores de mais cadência, impediu que o Fluminense pudesse ter uma opção de velocidade para quebrar o sistema defensivo atleticano com uma entrada na diagonal, uma jogada de linha de fundo ou um contra-ataque em alta velocidade.

A primeira etapa foi até interessante no Marcanã, com os dois clubes tentando encaixar seus estilos e algumas oportunidades surgindo para o Fluminense em jogadas laterais de Wágner e Cícero e para o Galo em alguns contragolpes ou lançamentos longos a partir do campo defensivo. A segunda parte, no entanto, foi muito menos inspirada. O Atlético continuou com seu sistema defensivo alinhado, mas não conseguiu encaixar mais jogadas de contra-ataque, tanto por cansaço dos homens de lado que correram muito no primeiro tempo para trás e para a frente, quanto pela dificuldade que Guilherme e Jô passaram a ter mais avançados. O atleta da seleção brasileira na Copa do Mundo errava quase tudo que tentava e não conseguia segurar a bola para aguardar a chegada dos homens de trás. Guilherme, por sua vez, trabalhava pouco com a bola no pé e, quando tentava dar opção de profundidade, acabava por se posicionar em impedimento. Neste sentido, Levir Culpi fez uma única substituição, trocando Luan por Cesinha na ponta-direita, com vistas a renovar o fôlego pelo setor. A mudança não surtiu muito efeito, mas o técnico alvinegro não parecia tão triste com um empate fora de casa contra um adversário direto.

No lado do Fluminense, Cristovão Borges tentou resolver algumas situações, colocando Chiquinho no lugar de Fernando para aumentar o apoio pela lateral-esquerda, muito pequeno enquanto o camisa 26 esteve em campo. O jovem Kenedy também entrou, ocupando a vaga de Edson, o que obrigou Cícero a ser recuado para a primeira linha de meio-campo. A intenção era melhorar a saída de trás e tentar dar um pouco de agressividade pelo lado direito na base da individualidade, o que também não se mostrou uma opção efetiva.

Galo mantém a proposta e troca apenas uma peça no segundo tempo. Flu é mais ousado e tenta dar melhor chegada de trás e mais agressividade pela ponta, sem sucesso, no entanto

Apesar das tentativas de Cristovão Borges, o placar ficou zerado até o fim dos noventa minutos no Maracanã e a torcida vai perdendo a paciência com o treinador tricolor, já que o Fluminense ganhou apenas um dos seus seis últimos jogos e viu o Santos vencer na rodada, fazendo o tricolor carioca cair para a oitava posição, a quatro pontos da zona da Libertadores. O Atlético-MG fica a dois pontos do G-4 e valoriza o empate. A proposta reativa é apenas uma opção, mas também visa a vitória como qualquer outra. Mesmo assim, quando ela não é possível, o zero no placar prova pelo menos que a fase defensiva da proposta foi bem aplicada e as correções precisam ser feitas apenas na fase ofensiva, em caso de Levir Culpi resolver novamente trabalhar com formação parecida ao longo das próximas rodadas.

*Dados estatísticos retirados do Footstats.net

Por João Marcos Soares (@JoaoMarcos__)