Pela sexta rodada da Süper Lig, o Galatasaray
recebeu o Fenerbahçe para o clássico de maior rivalidade do futebol turco. O
confronto é conhecido como Dérbi Intercontinental, já que o Galatasaray
pertence à parte de Istambul localizada na Europa e o Fenerbahçe à que se situa
na Ásia. Conhecido como um dos clássicos mais intensos do mundo, os duelos
entre os dois times acabam saindo um pouco do controle e, além do exagero
dentro de campo por parte dos jogadores, as torcidas também levam a rivalidade
para além do futebol, e, por vezes, a violência impera também fora de campo. No
jogo do último sábado, na Türk Telekom Arena, apenas os torcedores do time da
casa puderam se fazer presentes justamente para evitar este tipo de situação.
Ainda questionado desde que assumiu o time após sua
participação desastrosa na Copa do Mundo sob o comando da Itália, Cesare
Prandelli continua tentando encontrar seu sistema de jogo ideal à frente do
Galatasaray. O italiano já utilizou o 4-4-2 do antecessor Roberto Mancini, o
4-2-3-1 para aproveitar melhor Sneijder e até um esquema com três zagueiros na
derrota para o Arsenal pela Champions League. No dérbi, Prandelli buscou
preencher o meio-campo em um 4-1-4-1, com destaque para Felipe Melo entre as
duas linhas de quatro, Sneijder aberto pela esquerda e Burak Yilmaz como homem
mais avançado.
O Fenerbahçe de Ismail Kartal, por sua vez, também
foi a campo com três volantes, mas em desenho diferente. O ex-lateral dos
canários foi assistente-técnico do clube por alguns anos até receber a
oportunidade de ser o treinador principal neste ano, substituindo Ersun Yanal. Dos
três volantes escalados, Raul Meireles se posicionava mais à frente, na linha
de três meias, entre Dirk Kuyt e Alper Potuk, formando um 4-2-3-1 que aproveitava
a boa chegada do português no ataque. Sempre primeiro volante na seleção
portuguesa e volante de saída no Porto, Meireles já atuou mais adiantado
algumas vezes na Inglaterra, quando atuava pelo Chelsea campeão europeu de
2011-12, mas, principalmente quando defendeu o Liverpool, que tinha Lucas Leiva
como primeiro volante e Gerrard e Raul Meireles revezando entre a posição de
segundo volante e a meia central do 4-2-3-1 de Roy Hodgson e, depois, Kenny
Dalglish.
Opções de Prandelli e Kartal deixaram o primeiro tempo
concentrado no meio-campo, já que os dois times tinham poucas alternativas de
velocidade e não se caracterizavam pelo jogo transicional
O Fenerbahçe dominou as ações durante quase toda a
primeira parte, com Raul Meireles e Emre, que revezavam o posicionamento,
controlando a posse da bola e buscando a profundidade em Emenike e Kuyt, que procuravam
se movimentar para abrir espaços um para o outro mais à frente, já que o outro winger, Alper Potuk, é volante de origem
e dava poucas opções no ataque, trabalhando mais para ajudar na organização do
time no meio-campo, abrindo, portanto, espaço no extremo esquerdo para o apoio
do ofensivo lateral Kaner Erkin.
Na fase defensiva, o time do lado asiático de
Istambul fechava-se em duas linhas de quatro, liberando Meireles para marcar a
troca de passes de Selçuk Inan e Dzemaili na intermediária defensiva do
Galatasaray, enquanto Emenike dava o combate nos zagueiros rivais, que ganhavam
a companhia de Felipe Melo. O volante brasileiro recuava para fazer a saída de
três entre Chedjou e Semih, liberando os laterais para darem amplitude pelos
lados, já que Olcan Adin e, sobretudo Sneijder centralizavam bastante quando a
bola estava na posse do Galatasaray. Ainda no primeiro tempo, Emre sentiu lesão
e precisou ser substituído por Selçuk Sahin, que ocupava o mesmo espaço do
meio-campo que o capitão do Fener,
mas quebrou um pouco o ritmo por não ter as mesmas características que seu
antecessor. Desta forma, com a organização do Fenerbahçe concentrada em Raul
Meireles, o Galatasaray conseguiu equilibrar a partida ainda na primeira etapa.
4-4-1-1 da fase defensiva do Fenerbahçe não era tão
compacto e dava espaço no entrelinhas para Sneijder que, sozinho na criação e
com Olcan e Yilmaz se movimentando pouco à frente, não conseguiu fazer o
Galatasaray jogar no primeiro tempo (Reprodução: ESPN Brasil)
O Galatasaray de Cesare Prandelli se defendia no
4-1-4-1 e tinha suas linhas compactas, mas, como Sneijder nunca se destacou
pela recomposição defensiva quando atua pelo lado, o rival encontrava espaços
no entrelinhas já que Felipe Melo saía de seu setor para cobrir o lado esquerdo
da defesa e cedia espaços para Raul Meireles infiltrar ou encontrar um passe em
profundidade para Emenike, Kuyt ou um dos laterais.
Quando Sneijder conseguia executar a transição
defensiva rapidamente, o 4-1-4-1 de Prandelli não necessitava compensações e limitava
os espaços ao Fenerbahçe (Reprodução: ESPN Brasil)
Após um primeiro tempo morno, mas que teve o
Fenerbahçe superior, os times voltaram a campo com as mesmas formações que
terminaram a etapa inicial e o Galatasaray já mostrou uma iniciativa diferente
desde o primeiro minuto. Com as linhas de marcação um pouco mais altas, o time do
lado europeu de Istambul conseguiu assustar o rival, sobretudo com a maior
efetividade de Olcan pela direita e o apoio de Tarik pela esquerda, que começou
a aproveitar melhor o corredor que Sneijder proporcionava quando centralizava
para armar. A pressão inicial do Gala desestabilizou
um pouco o Fenerbahçe e, aos sete minutos, Bruno Alves deu voadora violenta nas
costas de Dzemaili e foi expulso por Cüneyt Çakir. Sem modificar peças, Mehmet
Topal recuou para atuar como zagueiro ao lado de Kadlec e Raul Meireles passou
a formar a segunda linha de quatro no meio-campo, deixando apenas Emenike à
frente.
Após alguns minutos de onze contra dez, os dois
técnicos resolveram mudar. No Galatasaray, Umut Bulut entrou no lugar de
Dzemaili e, no Fenerbahçe, Ali Kaldirim substituiu Emenike. Desta forma, o
Galatasaray passou a atuar em um 4-2-3-1, que variava pra 4-4-2 com a bola nos
pés. A ideia era ter Bulut recompondo pelo lado esquerdo para deixar Sneijder
sem responsabilidades muito relevantes com a transição defensiva. Quando o
Galatasaray recuperava a bola, o camisa 9 fazia companhia a Yilmaz na
referência e Sneijder recuava para organizar os ataques a partir da
intermediária ofensiva, caindo mais pelo lado esquerdo, mas sem invadir o
corredor extremo, que era exclusivo do lateral Tarik, ainda mais forte no apoio
após a expulsão de Bruno Alves. A mudança do Fenerbahçe, por seu turno, acabou
fazendo com que vários jogadores que já estavam em campo trocassem de posição.
Kuyt saiu da ponta-direita para ser o homem mais avançado e o lateral Erkin
adiantou para a ponta-esquerda, fazendo, assim, com que Potuk invertesse de
lado. Estas mudanças tinham a intenção de dar maior rigidez às linhas de defesa
do Fenerbahçe, que precisava se compactar na frente da sua área e impedir o
acesso do adversário com a bola no chão.
Com um a menos, Fenerbahçe fechou duas linhas de
quatro e dificultava muito o trabalho ofensivo do Galatasaray, que também
trocou Olcan por Emre Çolak na ponta-direita
Mesmo com um a mais, o time da casa não conseguia
furar o bloqueio adversário que tinha uma estratégia defensiva bastante
interessante. Sabendo que a criação do Galatasaray era concentrada nos pés de
Sneijder, Ismail Kartal compactou suas linhas em bloco baixo e, quando chegava
ao seu limite de posicionamento, os laterais se aproximavam dos zagueiros e os wingers recuavam ainda mais, deixando
Meireles e Seçuk Sahin combatendo a troca de passes do Galatasaray um pouco
mais à frente. Neste sentido, Yilmaz e Bulut eram quase nulos escondidos entre
os defensores do Fenerbahçe nas jogadas armadas pelo centro. Quando o Gala virava o jogo, os wingers voltavam para a segunda linha e
balançavam para o lado da bola rapidamente, buscando evitar que o adversário
conseguisse chegar até a linha de fundo.
A estratégia segurou o zero a zero por muito tempo,
mas, talvez por falta de paciência ou realmente por percepção, Sneijder parou
de tentar buscar o passe e começou a arriscar de fora sempre que enxergava
qualquer espaço. O holandês arriscou nove chutes, sendo sete de fora da área.
Dos nove tiros, sete foram no segundo tempo e seis após a expulsão de Bruno
Alves. De tanto tentar, Sneijder abriu o placar aos quarenta e três minutos do
segundo tempo, em linda finalização no ângulo direito de Volkan Demirel.
Fenerbahçe deixava Sahin e Meireles combatendo e
fechava praticamente uma linha de seis homens atrás para dificultar a
infiltração do Galatasaray. Momento do primeiro gol, quando Sneijder progride e,
com poucas alternativas, resolve arriscar, acertando finalização precisa sem
chances de defesa (Reprodução: ESPN Brasil)
Logo após o primeiro gol, a estratégia do
Fenerbahçe foi desfeita e o time foi pra cima para buscar o empate no abafa. Em
bola recuperada, Sneijder progrediu desde o campo defensivo e, da entrada da
área, acertou outro chute sensacional, desta vez no ângulo esquerdo de Volkan,
para definir a partida.
Mapa de movimentação de Wesley Sneijder: mesmo quando
teve mais liberdade de circulação no segundo tempo, o holandês continuou
utilizando mais o lado esquerdo para trabalhar com a bola, sendo deste setor
que partiu para marcar seus dois gols que decidiram o dérbi (Reprodução:
Squawka)
Ainda antes do fim, o Fenerbahçe conseguiu diminuir
o placar com Potuk, completando cruzamento da esquerda após situação irregular
em que a arbitragem não viu a bola sair pela linha lateral antes da jogada de
linha de fundo. O gol do Fener não
atrapalhou a festa do Galatasaray que, mesmo tendo um início difícil, conseguiu
se recuperar dentro da partida e rumar à vitória contra um valente Fenerbahçe,
que resistiu bravamente após a irresponsabilidade de Bruno Alves.
Com o resultado, o time do lado europeu de Istambul
assume a liderança provisória da Süper Lig e Cesare Prandelli ganha um respiro
e tanto para ter mais tranquilidade para se adaptar ao futebol turco e para
tentar fazer com que o Galatasaray se adapte ao estilo que o italiano busca
impor ao time. Na próxima quarta-feira, o time turco recebe o Borussia Dortmund
pela Champions League e precisa se recuperar na competição após a goleada
sofrida para o Arsenal. Os comandados de Prandelli, com apenas um ponto em dois
jogos, necessitam aproveitar a má fase dos alemães e confirmar os três pontos
em casa se tiverem alguma pretensão de classificação neste grupo bastante
complicado, que ainda conta com o Anderlecht, da Bélgica.
*Dados estatísticos retirados do Squawka
Por João Marcos Soares (@JoaoMarcos__)