A Copa do Brasil de 2014 tem sido uma das mais
emocionantes dos últimos anos. O formato com a participação dos times que
estiveram na Libertadores durante o primeiro semestre favorece a
competitividade e possibilita que grandes equipes do futebol nacional cheguem
às fases mais agudas. As semifinais desta edição contam com Cruzeiro e Santos
em uma perna e Flamengo e Atlético-MG na outra.
Flamengo e Atlético são times históricos dentro de
futebol brasileiro e têm uma rivalidade especial cultivada, sobretudo, nos anos
80. O Galo, tido como freguês pelo rubro-negro carioca, chegou para o primeiro
embate no Maracanã em ótima fase, tendo batido o Corinthians em um confronto antológico no Mineirão na fase anterior e, no Brasileirão, o time dirigido por
Levir Culpi vive seu melhor momento, ocupando a terceira colocação. O Flamengo
de Vanderlei Luxemburgo também vive boa situação e, praticamente livre do
fantasma do rebaixamento, vai tentando manter a regularidade no campeonato
brasileiro e buscando o bicampeonato da Copa do Brasil.
Sem o mais uma vez lesionado Guilherme, o grande
responsável pela classificação heroica do Galo contra o Corinthians, Levir
Culpi resolveu montar um Atlético um pouco diferente das últimas partidas para
visitar o Rio de Janeiro. Dátolo, que vinha atuando muito bem um pouco mais
atrás, foi adiantando para trabalhar na meia central de uma linha de três
jogadores, que também contava com Carlos e Maicosuel, que ganhou a vaga de Luan
pelos lados. Com isso, Pierre voltou ao meio-campo para fazer uma dupla de
volantes mais consistente ao lado de Josué, enquanto Diego Tardelli era o homem
mais avançado sem a bola, mas que, com ela na posse do Galo, percorria todos os
setores do terço ofensivo com extrema liberdade de movimentação.
Sem surpresas, o Flamengo foi a campo em seu
sistema tradicional sob o comando de Vanderlei Luxemburgo, o 4-4-2 que tem
Márcio Araújo e Everton fechando os lados, Victor Cáceres como volante de
contenção e Hector Canteros organizando o rubro-negro com a bola, aguardando as
sempre eficientes subidas dos laterais, Leo Moura e João Paulo. À frente,
Gabriel e Eduardo da Silva tentam se movimentar para dar opções aos
companheiros, com Eduardo sendo o homem que dá profundidade aos passes por
dentro e faz a referência para os cruzamentos na área. Gabriel é a alternativa
de velocidade para os contra-ataques e individualidade para quebrar a marcação
adversária com base no improviso.
Flamengo em seu sistema tradicional e Galo abandonando
o 4-4-2 para atuar em um 4-2-3-1 um pouco mais reativo e sem a mesma mobilidade
Com a bola, o Atlético-MG buscava movimentação
entre seus três homens mais avançados, tendo Tardelli recuando e Carlos
infiltrando entre os zagueiros flamenguistas para fazer o papel da referência
quando da saída de Tardelli. Sem a bola, o time mineiro fechava-se em duas
linhas de quatro, sendo a segunda formada pelo recuo de Maicosuel e Carlos
pelos extremos. Dátolo acompanhava a marcação e tentava atrapalhar a saída de bola do meio-campo rubro-negro, enquanto Diego Tardelli ficava mais à frente
para brigar por um eventual chutão e também para marcar as trocas de passes dos
zagueiros do Flamengo, que raramente aconteciam, já que o time de Luxemburgo
pouco tinha a bola e, quando a mantinha em sua posse, era bastante vertical.
Duas linhas de quatro do Galo: bastante compactas, mas
sem sincronia no balanceamento. Enquanto a linha de defesa balançava para o lado
esquerdo, a de meio-campo balançava para o direito. O lançamento, neste caso,
era em profundidade para Eduardo, mas, se fosse para João Paulo, bem aberto na
esquerda, poderia passar por Carlos e não ter a cobertura de Marcos Rocha
(Reprodução: Rede Globo)
O Flamengo também tinha suas duas linhas de quatro
na fase defensiva, que balançavam um pouco melhor que as do Atlético. No
primeiro tempo, o time da casa teve algumas chances para abrir o placar,
possibilitadas por espaços na defesa atleticana. O Galo, por sua vez, esbarrava
na rigidez das duas linhas rubro-negras e pouco criava na primeira etapa, tendo
apenas duas chances: uma infiltração de Marcos Rocha, que provocou
superioridade numérica ao Galo na área adversária e possibilitou ao lateral-direito uma cabeçada
perigosa. Marcos Rocha também foi o protagonista da segunda boa oportunidade
atleticana na etapa inicial, em um chute despretensioso, mas que assustou a
meta de Paulo Victor.
4-4-2 rubro-negro pouco cedeu espaços para o menos
veloz, mas ainda móvel ataque atleticano (Reprodução: Rede Globo)
A opção de Levir por Dátolo mais avançado pareceu
ter a intenção de contar com o argentino próximo da área adversária,
possibilitando, assim, um homem de maior qualidade para buscar o passe de
ruptura com direção aos três atacantes. A alternativa poderia ter dado mais
certo se Dátolo estivesse em um dia mais feliz, entretanto, o camisa 23 tinha
bastante dificuldades de se movimentar no entrelinhas e errou passes simples
durante toda a partida, irritando Levir Culpi desde o primeiro tempo. A ideia
de ter Dátolo mais à frente, além de suprir a falta do último passe causada
pela ausência de Guilherme, também pode ser explicada pela maior confiança que
Levir tem em Josué para executar a saída de bola, em comparação com Leandro
Donizete, que vinha atuando como primeiro volante antes de se lesionar. Josué acertou
incríveis 80 passes no Maracanã. O segundo colocado no fundamento foi Leo Moura,
com 57, 23 a menos.
Ainda no fim do primeiro tempo, Márcio Araújo passou a compor uma trinca de volantes e Gabriel abriu pela direita, mas o desenho não se manteve para a segunda etapa, quando o time voltou para o 4-4-2. Mesmo com o Flamengo tendo as chances mais claras, a partida não foi dominada por nenhum dos times, mantendo-se equilibrada durante os 90 minutos. Já que nenhuma das duas equipes teve o controle do jogo, o duelo acabou decidido na melhor estratégia, que foi traçada por Vanderlei Luxemburgo. Alcançando um gol a partir de uma bola parada para abrir o placar, o técnico rubro-negro resolveu modificar suas peças e o desenho tático do time em campo. Entraram Luiz Antônio, Nixon e Amaral nos lugares de Everton, Eduardo
e Canteros. Com isso, o Flamengo passou a se postar em um 4-5-1 bastante
reativo, que tinha Amaral, Cáceres e Luiz Antônio formando um trio de volantes,
Márcio Araújo e Nixon fechando os flancos e Gabriel solto à frente em uma zona
morta para usar sua velocidade para o contragolpe que era a esperança
flamenguista de ampliar o resultado favorável para ter mais tranquilidade no
segundo jogo. Neste sentido, a ideia de Vanderlei foi extremamente bem sucedida
e, em um dos contra-ataques puxados por Gabriel, Josué cometeu pênalti bizarro
e desnecessário no camisa 17 flamenguista. O experiente Chicão, de atuação
bastante segura também na defesa, foi para a cobrança e anotou o segundo gol.
Lance do pênalti sofrido por Gabriel, que arrancou
sozinho desde o campo defensivo sem ser parado pela marcação atleticana. No
momento da infração, Gabriel estava sozinho e o Galo tinha quatro atletas na
jogada e mais Alex Silva vigiando a chegada de Nixon mais atrás. Mesmo assim,
Josué acabou cometendo o pênalti desnecessário que frustrou as expectativas do
Atlético de conseguir pelo menos um empate no Maracanã (Reprodução: Rede Globo)
Sem muitas alternativas, Levir mandou o Galo pra
cima para tentar pelo menos um gol fora de casa. Não bastasse o placar
desfavorável, a ideia do técnico de colocar André para ter uma referência na
área e buscar a bola aérea ainda foi por água abaixo pela lesão do lateral
Douglas Santos, que fez o Galo queimar sua última substituição. Sem a
referência para buscar o empate no abafa, o Atlético teve que tentar infiltrar
na ainda mais rígida defesa rubro-negra com a bola no chão, o que dificultou
ainda mais o trabalho ofensivo do time mineiro, já que o Flamengo estava muito
bem postado defensivamente e não cedia qualquer espaço. A única grande chance
atleticana surgiu a partir de uma jogada de bola parada, que sobrou para finalização
da entrada de área de Marion, que Paulo Victor defendeu e, no rebote, Dátolo
chutou novamente em cima do goleiro, desperdiçando a principal oportunidade do
alvinegro na partida.
Flamengo fechou-se no campo defensivo e, no
contra-ataque, conseguiu construir uma ótima vantagem para o jogo da volta
Com o resultado, o Flamengo consegue até mais do
que esperava e, agora, deve ir a Belo Horizonte para jogar de maneira reativa e
segurar a vantagem, usando o exemplo negativo do Corinthians para não deixar
escapar a classificação à final. Everton, que saiu machucado no segundo tempo,
é provável baixa para o rubro-negro carioca, que sentiria muito sua ausência
como única opção de desafogo pelos lados, já que Márcio Araújo pouco colabora
com a fase ofensiva pela direita.
O Galo, por sua vez, tentará reverter mais uma
desvantagem, como fez notadamente na Libertadores do ano passado e nas
quartas-de-final contra o Corinthians, desta vez contra o Flamengo, algoz
histórico do time mineiro. Para tanto, Levir Culpi sonha em poder ter Guilherme
novamente disponível para montar sistema parecido com o que tem dado tão certo
no segundo turno do Brasileirão e que foi muito bem no jogo da volta contra o
Corinthians, pela Copa do Brasil.
*Dados estatísticos retirados do Footstats
Por João Marcos Soares (@JoaoMarcos__)