segunda-feira, 10 de novembro de 2014

No equilibrado clássico catarinense, venceu quem arriscou mais e soube aproveitar sua grande chance

Em mais um confronto direto nessa fase final de Brasileirão, Figueirense e Chapecoense se enfrentaram no estádio Orlando Scarpelli. Os clubes catarinenses chegaram para o clássico estadual com problemas parecidos. A Chapecoense não teve Rodrigo Biro e Camilo e, pelo lado do Figueirense, Paulo Roberto, Rivaldo e Giovanni Augusto são os titulares que não puderam estar em campo. Além dos desfalques, os times tiveram dois jogadores importantes sem as suas melhores condições físicas: o centroavante Leandro do Verdão do Oeste e o meio-campista Marco Antônio do Furacão do Estreito entraram em campo no sacrifício.

A semana que precedeu o dérbi foi bastante tensa, o que é natural pela importância da partida para as pretensões das duas equipes no campeonato e também por se tratar de uma rivalidade regional. Com os problemas que teve durante a semana de treinamentos e pela punição do STJD a Rivaldo, Argel Fucks teve de recorrer às “pratas da casa” e montar um meio-campo alternativo, com Jefferson – que vinha atuando na lateral-direita pela lesão de Leandro Silva – e Leo Lisboa trabalhando mais perto dos atacantes e Dener fazendo a primeira função no meio-campo. Além dos três, Clayton também é da base alvinegra, que tem revelado atletas interessantes do ano passado pra cá.

Neste sentido, Argel abdicou do losango de meio-campo e voltou a atuar com meias recompondo pelos lados e saindo com liberdade para armar quando o time recuperava a bola. No centro do meio-campo, havia um bom equilíbrio entre a ótima marcação e saída de bola de Dener e a capacidade de organização de Marco Antônio, homem que pensa o jogo alvinegro partindo de trás. À frente, Clayton e Marcão buscavam se movimentar, com o garoto saindo pela direita para ajudar nas jogadas de linha de fundo e Marcão se posicionando na referência e voltando um pouco para receber e prender a bola no aguardo dos homens de trás.

A Chapecoense, por sua vez, foi a campo novamente no 4-3-1-2 de Jorginho que, sem Camilo, teve Júnior Timbó trabalhando como enganche para Leandro e Tiago Luís, os homens de frente, que tinham movimentação parecida com a do Figueirense, com Tiago acrescentando improviso e velocidade e Leandro brigando entre os zagueiros e fazendo a referência. Da trinca de volantes, Diones e Bruno Silva guardavam posição e Ricardo Conceição era quem chegava no terço ofensivo, mais buscando a infiltração, sua principal característica, do que ajudando na organização do time do oeste catarinense.

Figueirense de volta ao 4-4-2 e Chapecoense com seu losango de meio-campo tradicional desde a chegada de Jorginho

Caricaturalmente, a Chapecoense é nacionalmente apontada como um time de jogo reativo. As estatísticas, porém, demonstram uma conjuntura diferente. Na sequência complicada que o Verdão enfrentou antes do clássico, foram quatro jogos nos quais teve mais posse de bola que seus adversários. O Atlético-MG, fora de casa, o São Paulo, um dos times que mais troca passes no campeonato, o Santos, que também gosta de ter a bola, e inclusive na derrota por 3 a 0 para o Flamengo, no Maracanã. Muitas vezes, times que apostam no jogo transicional, que é o caso da Chapecoense, ficam com o espectro de retrancas. Ter uma defesa compacta sem a bola e um contra-ataque eficiente são virtudes que todos os times deveriam buscar. Não quer dizer, de forma alguma, que o técnico é adepto da retranca e que joga por uma bola, como Argel Fucks, que raramente recorre ao lugar-comum, afirmou de forma equivocada durante a semana e reafirmou após o jogo.

Sem a bola, os comandados de Jorginho tinham os três volantes posicionados à frente da defesa e balançando corretamente para o lado da bola, dificultando o trabalho do Figueirense no meio-campo. Dos três jogadores mais avançados, apenas Tiago Luís tinha função defensiva destacada, que era acompanhar as subidas do lateral Leandro Silva pelo menos até a intermediária defensiva. Quando recuperava a posse, a Chape acelerava a transição, visando pegar a defesa adversária ainda desmontada. Neste sentido, pode-se imaginar e, após observar as estatísticas, afirmar que a Chapecoense troca poucos passes, já que é bastante objetiva quando tem a bola em sua posse e joga em alta velocidade, diferente do Figueirense, que também gosta de ter a bola, mas que tem um meio-campo cadenciador, com uma transição mais lenta, o que também não é necessariamente um defeito. A questão é de característica e não de méritos. É possível ter posse de bola trocando poucos passes e indo direto ao ponto, como faz a Chapecoense, ou rodando a bola na defesa e no meio-campo para pacientemente buscar a melhor jogada, como é o caso do Figueirense.

Figueira tem a bola na esquerda, enquanto a linha de volantes da Chape balança com sincronia para fechar os espaços (Reprodução: Premiere)

O primeiro tempo foi pouco produtivo no Scarpelli e a principal chance saiu para o time visitante. O goleiro Danilo interceptou escanteio do Figueirense e rapidamente iniciou a transição ofensiva, acionando Tiago Luís, livre na esquerda. O camisa 7 partiu rapidamente e contou com o apoio de Jussandro e Júnior Timbó e, contra apenas dois defensores rivais, os três jogadores aceleraram um contra-ataque de manual, até que Timbó, já dentro da área, deu o passe final para Ricardo Conceição, que partira do campo defensivo. Provavelmente desgastado por ter corrido em alta velocidade de área a área, o volante do Verdão finalizou, praticamente sem goleiro, por cima da trave de Tiago Volpi, desperdiçando incrível possibilidade de abrir o placar.

Imagem flagra dois jogadores do Figueirense contra três da Chapecoense, além de Ricardo Conceição, que partiu de trás para completar a jogada para fora (Reprodução: Premiere)

O Figueirense teve extremas dificuldades para criar durante a primeira etapa, com Leo Lisboa e Jefferson não conseguindo acrescentar intensidade na armação e errando vários passes importantes no terço ofensivo. Neste sentido, Argel mudou logo no intervalo, voltando com Felipe na vaga de Jefferson. Pelo desgaste de Leandro, que já não entrou 100%, Jorginho teve de mexer e promover Bruno Rangel à referência no ataque alviverde.

A mudança do Figueirense, que permaneceu no mesmo sistema de jogo, não surtiu efeito e o time continuou sem intensidade, com Clayton perdendo os duelos com os laterais da Chapecoense e Leo Lisboa e Felipe sem espaços entre as linhas de marcação adversárias. Neste sentido, antes dos 10 minutos, Argel mexeu novamente, modificando, desta vez, a estrutura tática do Figueira. Pablo substituiu Leo Lisboa, e passou a atuar como ponta-de-lança, atrás de Marcão, que foi de vez trabalhar entre os dois zagueiros da Chapecoense. Neste sentido, Clayton subiu de produção por jogar mais aberto pela direita e receber a bola de frente. Mais à frente, o garoto tinha de receber a bola de costas e, sendo franzino, sentia dificuldades de controlar a bola e conseguir girar contra Douglas Grolli e Fabiano, muito mais fortes fisicamente. Pela esquerda, Felipe fazia a recomposição sem a bola e centralizava com ela para armar.

Após o jogo, Argel foi extremamente feliz ao analisar Pablo, o homem que, mais uma vez, foi decisivo para o Figueirense. O comandante alvinegro comparou o estilo do camisa 11 do Furação ao de Ricardo Goulart, afirmando que Pablo, além do porte físico, também se assemelha ao atacante do Cruzeiro por jogar melhor atrás do centroavante, ajudando na armação, partindo pra cima para buscar uma finalização de fora, ou caindo pelos lados para criar uma jogada interessante, além de ter força física para brigar entre os zagueiros e chegar na área para finalizar, seja pelo alto ou por baixo. Como Argel também afirmou, apesar de ter limitações técnicas em comparação a Goulart, Pablo tem mais velocidade, o que permite ao técnico alvinegro escalá-lo, por vezes, como ponta.

O gol que decidiu a partida surgiu dos pés Tiago Volpi que, assim como Danilo fez na primeira etapa, fez uma defesa e, inteligentemente, iniciou rápido a transição ofensiva, com Clayton recebendo no meio-campo e lançando Pablo que foi a linha de fundo pelo lado direito e fez o passe para Marcão finalizar de letra e abrir o placar, levantando os mais de 15 mil alvinegros que foram ao Scarpelli e empurraram o Figueirense a essa vitória importante. A participação de Tiago Volpi e Danilo nos lances capitais da partida demonstra a importância da inteligência dos goleiros na reposição de bola, que poderia ter decidido o jogo para a Chapecoense na etapa inicial, e decidiu para o Figueirense na complementar.

A semelhança citada por Argel entre Pablo e Ricardo Goulart é exemplificada pela jogada do terceiro gol do Cruzeiro contra o Criciúma, na mesma rodada, onde Ricardo Goulart recebeu e fez jogada de linha de fundo pelo lado esquerdo para Willian finalizar a decretar a vitória da Raposa no Mineirão, em lance parecido com o do gol do Figueirense contra a Chapecoense.

Jorginho viu a necessidade de mudar de estratégia para buscar o empate fora de casa e colocou Fabinho Alves e Zezinho nas vagas de Júnior Timbó e Diones, fazendo a Chapecoense sair do losango para um 4-2-3-1, que tinha Fabinho e Tiago Luís pelos lados e Zezinho no centro da linha de três jogadores atrás de Bruno Rangel. Após o gol, o Figueira passou a fechar duas linhas de quatro extremamente compactas na marcação, que era iniciada com Pablo e Marcão pressionando a saída dos zagueiros adversários, passando pela segunda linha, que passou a ter Clayton e Felipe bastante comprometidos com a fase defensiva ao fechar os extremos da linha de meio-campo, que se tornou bastante rígida e balançava de maneira satisfatória, impossibilitando a virada de jogo e negando espaços para a Chapecoense explorar. Nesse sentido, o jogo de transição veloz que o time do oeste impôs no primeiro tempo e na primeira metade do segundo, foi substituído por uma posse de bola estéril na defesa, que se arrastou até o fim da partida.

Marcão pressiona e rouba a bola de Tiago Luís, que, sem espaços no entrelinhas, voltou até o meio-campo para buscar a bola. Enquanto isso, a linha de meio-campo do Figueirense permanecia formada, caso o atacante conseguisse atravessar a pressão de Marcão (Reprodução: Premiere)

Formações da metade final do segundo tempo, quando Figueirense e Chapecoense passaram a atuar no 4-2-3-1

A vitória no clássico catarinense afasta o Figueirense das proximidades da zona do rebaixamento e deixa o time, a cinco rodadas do fim da competição, com possibilidades mais remotas de voltar à Série B. Além da força do elenco alvinegro, que novamente superou os desfalques, a vitória também mostra o bom trabalho de categorias de base que tem sido feito no CFT do Cambirela, já que o Figueirense teve 4 “pratas da casa” entre os titulares, além de Yago, que entrou muito bem improvisado na lateral-direita após a lesão de Leandro Silva no segundo tempo. Mesmo com Leo Lisboa e Jefferson não tendo boas atuações, os jovens do Figueira foram importantes, com Clayton crescendo de produção no segundo tempo e Dener, de apenas 19 anos e sem atuar desde agosto por lesão, sendo o principal destaque individual do jogo, com performance espetacular no meio-campo alvinegro, tanto na marcação quando na saída de bola.

A Chapecoense, com a derrota, aproxima-se ainda mais do Z-4 e, assim como o Figueirense tem feito, terá de buscar no apoio da fanática torcida de Chapecó os resultados nos jogos em casa para permanecer na Série A e evitar o descenso já em sua temporada de estreia na primeira divisão do futebol nacional.

Por João Marcos Soares (@JoaoMarcos__)