domingo, 18 de janeiro de 2015

4ª parte do Especial Seleção Brasileira de 2002: sistema ofensivo

O Especial Seleção Brasileira de 2002 está chegando ao fim. Os três anteriores posts analisaram a transição ataque-defesa, o sistema defensivo e a transição defesa-ataque da equipe penta-campeã de Felipão. Para encerrar esta série, eis o último assunto abordado: sistema ofensivo.

No último tópico do post sobre a transição defesa-ataque foi baseado nas movimentações entrelinhas e/ ou nas movimentações para zona morta dos jogadores. Como o sistema ofensivo é a fase de jogo logo adiante desta transição e como o time de 2002 de Luiz Felipe Scolari gostava de ter a bola no pé, o início do sistema ofensivo tem o mesmo princípio e sub-princípio tático: passes curtos com movimentações inteligentes.


O destaque no início do sistema ofensivo, além de Kleberson já demonstrado no último post, fica também para os três R’s. Ronaldo, Rivaldo e Ronaldinho Gaúcho sempre estavam posicionados em alguma entrelinha e/ ou alguma zona morta do campo e, deste modo, livres para receber qualquer passe de algum companheiro de equipe. 


Na partida de estreia daquela Copa do Mundo, Ronaldo já demonstrara indícios de sua movimentação inteligente. No caso do flagrante acima, percebe-se o camisa 9 canarinho como referência do ataque, mas longe da linha defensiva da Turquia. Ou seja, na entrelinha entre a linha defensiva e a do meio-de-campo adversária.

Nas quartas-de-final, a mesma movimentação ofensiva continuava. No caso da imagem acima, nota-se Roberto Carlos com a bola, Kleberson, Ronaldinho Gaúcho e Rivaldo em zonas mortas e Ronaldo na entrelinhas. A continuidade da transição defesa-ataque através de passes curtos aumentava substancialmente com estas movimentações dos três R’s. 


Mesmo sendo considerada uma das partidas mais difíceis para o caminho do penta, a partida contra a Inglaterra foi a que os três R’s mais se movimentaram querendo decidir a partida. O caso do flagrante anterior é o mais claro. Após Ronaldinho Gaúcho ter se movimentado na entrelinhas do time inglês e ter recebido o passe de Edmilson, ele teria a opção de Ronaldo e Rivaldo na mesma entrelinha que a dele. Ou seja, os três R’s estavam posicionados livres para receber qualquer passe. Era muita genialidade em uma só seleção.


Tamanha genialidade em se movimentar que os três R’s trocavam de posição entre si, durante o ataque, pois Ronaldo se desprendia freqüentemente do zagueiro que estava marcando-o. Na imagem acima, nota-se Ronaldo longe do seu marcador, o zagueiro Campbell, enquanto que Ronaldinho Gaúcho e Rivaldo realizam a profundidade do ataque e empurram a linha defensiva inglesa. 

     No terço ofensivo, as movimentações inteligentes dos jogadores ainda continuavam. Mas agora com a possibilidade maior de gol, as movimentações nas zonas mortas aconteciam com mais objetividade e com intuito de abrir espaço para finalizar. Mais uma vez, os R’s faziam a diferença neste aspecto tático do sistema ofensivo.


Cafú e Roberto Carlos frequentemente faziam parte do sistema ofensivo com Ronaldinho Gaúcho, Rivaldo e Ronaldo. Ambos atacavam simultaneamente, mas só entravam na área adversária quando era possível. No flagrante acima, percebe-se que a movimentação na diagonal de Rivaldo e o posicionamento no centro da área de Ronaldo fizeram com que eles ficassem marcados respectivamente pelo lateral-direito e o zagueiro da direita da Bélgica. Com este balanço defensivo europeu, abriu-se espaço na zona morta e a possibilidade para a entrada na área de Roberto Carlos. 

Já nesta imagem –que é a do primeiro gol contra a Inglaterra-, Ronaldinho Gaúcho, após de desvencilhar do seu marcador, conduziu a bola à frente para esperar até o momento certo para tocar para Ronaldo ou Rivaldo. Nesta situação em que há dois jogadores abertos com possibilidade de passe, a condução da bola serve para gerar indecisão nos dois adversários para saber quem avança para pressionar a bola e, quando houver esta decisão, o passe é realizado para o jogador que ficou livre. Movimentação de Ronaldo e Rivaldo somada à inteligência de jogo de Ronaldinho Gaúcho resultou no gol de Rivaldo, o gol de empate desta partida. Movimentação com intuito de finalização. 

Além destas movimentações, dois aspetos ofensivos eram constantemente gerados durante o ataque. A amplitude e a profundidade eram geradas e geravam desconforto para os sistemas defensivos adversários.

A amplitude do ataque já era formada antes mesmo do terço ofensivo. Já no terço central e com o avanço simultâneo de Cafú e Roberto Carlos, a amplitude do sistema ofensivo brasileiro de 2002 já era estabilizada. No terço ofensivo, era só manter. Na imagem acima, nota-se Roberto Carlos na faixa da esquerda com a bola enquanto que Cafú está bem aberto pela direita e, assim, gerando  amplitude já no terço central do campo.

Já neste flagrante, percebe-se a amplitude do ataque criada por Cafú e Roberto Carlos e a profundidade por Ronaldo e também Cafú. Como Ronaldo era a referência do ataque e este gostava de se movimentar na entrelinha adversária, algumas vezes, a profundidade do ataque passava a ser mantida pelo ala oposto da jogada –assim como é o caso da imagem acima. Cafú e Roberto Carlos também se movimentavam nas entrelinhas e, para tal, eles inicialmente empurravam o seu marcador e, depois, recuavam para receber longe do seu adversário –assim como está fazendo Roberto Carlos no flagrante. O ala esquerdo brasileiro já está longe do lateral-direito belga e, assim, gerando uma linha de passe para Rivaldo.

Assim como já foi demonstrado anteriormente, Ronaldo gostava de se movimentar na entrelinhas ou na zona morta do campo e, assim, saindo da referência do ataque verde-amarelo. No caso flagrante acima, nota-se a amplitude novamente criada por Cafú e Roberto Carlos e a profundidade por Ronaldinho Gaúcho. Sistema ofensivo com princípios e sub-princípios somado ao talento brasileiro não tinha como não vir aquele título.  

Enfim, termina aqui o Especial Seleção Brasileira de 2002. A equipe Prancheta Tática espera que o leitor tenha visto que esta seleção não foi tão “antiga” quanto parece, pois tinha aspectos táticos dos quais estão realizando atualmente e outros aspectos considerados “modernos”. Luiz Felipe Scolari decepcionou em 2014, mas a sua referência poderia ter sido ele mesmo para que o placar fosse um pouco diferente. Já que este próprio técnico havia mostrado maior leitura de jogo no seu Palmeiras de 1999 –como este site mostrou no Especial Palmeiras de 1999- e na Seleção Brasileira de 2002 –com este especial tático- do que em relação ao que fez na Copa do Mundo de 2014.

Por Caio Gondo (@CaioGondo)